Direitos do Cidadão
6 de Abril de 2021 às 17h15
MPF entra com mandado de segurança para garantir recebimento de pedidos de regularização migratória pela DPF em Passo Fundo (RS)
Normas ilegais têm impedido acesso de migrantes a solicitações de refúgio, acolhida humanitária e afins
Arte: Secom/MPF
O Ministério Público Federal (MPF) impetrou mandado de segurança com pedido de liminar em desfavor do delegado-chefe da Delegacia de Polícia Federal (DPF) em Passo Fundo (RS) para garantir que os migrantes que ingressaram no país após o fechamento das fronteiras em 2020 e que necessitem dos serviços da DPF no município sejam devidamente atendidos, assegurando-se ao solicitante o direito de requerer administrativamente regularização migratória, nos termos da Lei 13.445/2017 e da Lei 9.474/1997, mediante entrega do protocolo respectivo, e sem que seja feito juízo prévio de (in)admissibilidade dos pedidos. Ainda, que não seja exigida dos migrantes que entraram de maneira irregular a prévia comprovação, em passaporte, de registro de entrada no país pelo local de ingresso.
No mandado de segurança, o MPF pede também que o delegado-chefe seja impedido de adotar quaisquer atos de inabilitação do pedido de refúgio, deportação, repatriação ou outra medida compulsória de saída dos migrantes que procurem atendimento na delegacia e que estejam previstos no artigo 8º da Portaria Interministerial 652/2021 ou em portarias que venham a lhe suceder e que contenham os mesmos vícios de ilegalidade e inconstitucionalidade.
Em março deste ano, após investigações ocorridas no âmbito de procedimento preparatório instaurado para apurar deficiências no atendimento aos migrantes por parte da Polícia Federal no município, foi expedida recomendação para que a DPF em Passo Fundo adotasse as providências necessárias para receber as solicitações de refúgio, acolhida humanitária e afins, sem exercer juízo prévio de admissibilidade dos pedidos, bem como que deixasse de exigir prévia comprovação, no passaporte, de entrada no país pelo local de ingresso, em caso de entrada irregular.
Em resposta, a DPF disse que não acataria a recomendação, alegando que recentes portarias editadas pelo Ministério da Justiça sobre o tema determinariam a impossibilidade de recebimento do pedido de refúgio quando do ingresso irregular de estrangeiro, sendo a Portaria 652/2021 a mais recente. Dispondo sobre a “restrição excepcional e temporária de entrada no país de estrangeiros, de qualquer nacionalidade, conforme recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)”, essa norma infralegal, em seu artigo 8º, determina sanções em casos de descumprimento das medidas, quais sejam, responsabilização civil, administrativa e penal; repatriação ou deportação imediata; e ainda inabilitação de pedido de refúgio.
Em razão da pandemia do novo coronavírus, desde março de 2020, houve a expedição de uma sucessão de portarias interministeriais estabelecendo restrição excepcional e temporária, por rodovias, portos e aeroportos de entrada e saída no país. No entanto, para o MPF, as medidas de combate à disseminação do coronavírus não podem acarretar a supressão de direitos humanos ou a instauração de uma ordem jurídica contrária aos ditames mínimos de um devido processo legal, o que abrange as populações migrantes e o tratamento dado em pontos de fronteira.
Apesar de os Estados, no âmbito do Direito Internacional, terem o poder soberano de regular a entrada de não nacionais, uma resposta eficaz a possíveis ameaças à saúde pública não pode criar obstáculos ou mesmo violar direitos, sejam processuais ou individuais, de pessoas que fogem de seus países de origem em razão de perseguição pelos motivos que acionam as medidas de proteção e salvaguardas previstas na Lei 9.474/1997 e na Convenção sobre Refugiados, de 1951. Nesse sentido, a previsão de “inabilitação de pedido de refúgio” para não nacionais que, descumprindo as medidas excepcionais de restrição disciplinadas nas portarias, entrem no território nacional, não está em conformidade com os padrões de proteção estabelecidos pelo Direito Internacional e mesmo pelo próprio ordenamento interno brasileiro.
O próprio artigo 8º da Lei 9.474/1997 estabelece que “o ingresso irregular no território nacional não constitui impedimento para o estrangeiro solicitar refúgio às autoridades competentes”, o que, segundo o MPF, seria suficiente para derrubar a sanção de inabilitação do refúgio, prevista exclusivamente em atos infralegais.
Assim, no caso concreto, é patentemente ilegal e inconstitucional a conduta da DPF de simplesmente recusar o protocolo dos pedidos de refúgio formulados pelos migrantes com base em portarias, “seja pela flagrante ilegalidade desses atos normativos, seja por exorbitar de suas atribuições ao exercer esse tipo de ‘filtro’”. Também é ilegal que, nos casos de entrada irregular, se exija a prévia comprovação, no passaporte, de entrada no país pelo local de ingresso ou ainda que se negue a possibilidade de o migrante conseguir obter a regularização por outros meios, como a autorização de residência.
De acordo com o MPF, as sanções e o tratamento discriminatório conferido aos migrantes têm propiciado o cometimento de ilegalidades por parte da Polícia Federal em Passo Fundo, que extrai de dispositivos infralegais fundamento para praticar condutas incompatíveis com a legislação e, mais do que isso, atentatórias de normas fundantes da Constituição da República, do Direito Internacional dos Refugiados, do Direito Internacional dos Direitos Humanos, do Estatuto dos Refugiados e da Lei de Migração, podendo inclusive acarretar a responsabilização internacional do Estado brasileiro por graves violações de direitos humanos, o que demanda a intervenção judicial para correção das ilegalidades.
Número do processo para acompanhamento: 5002213-35.2021.4.04.7104.
Assessoria de Comunicação Social
Ministério Público Federal no Rio Grande do Sul
Telefone MPF: (51) 3284-7200
Telefones ASCOM: (51) 3284-7250 / 98423 9146
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6 de Abril de 2021 às 17h15
MPF entra com mandado de segurança para garantir recebimento de pedidos de regularização migratória pela DPF em Passo Fundo (RS)
Normas ilegais têm impedido acesso de migrantes a solicitações de refúgio, acolhida humanitária e afins
Arte: Secom/MPF
O Ministério Público Federal (MPF) impetrou mandado de segurança com pedido de liminar em desfavor do delegado-chefe da Delegacia de Polícia Federal (DPF) em Passo Fundo (RS) para garantir que os migrantes que ingressaram no país após o fechamento das fronteiras em 2020 e que necessitem dos serviços da DPF no município sejam devidamente atendidos, assegurando-se ao solicitante o direito de requerer administrativamente regularização migratória, nos termos da Lei 13.445/2017 e da Lei 9.474/1997, mediante entrega do protocolo respectivo, e sem que seja feito juízo prévio de (in)admissibilidade dos pedidos. Ainda, que não seja exigida dos migrantes que entraram de maneira irregular a prévia comprovação, em passaporte, de registro de entrada no país pelo local de ingresso.
No mandado de segurança, o MPF pede também que o delegado-chefe seja impedido de adotar quaisquer atos de inabilitação do pedido de refúgio, deportação, repatriação ou outra medida compulsória de saída dos migrantes que procurem atendimento na delegacia e que estejam previstos no artigo 8º da Portaria Interministerial 652/2021 ou em portarias que venham a lhe suceder e que contenham os mesmos vícios de ilegalidade e inconstitucionalidade.
Em março deste ano, após investigações ocorridas no âmbito de procedimento preparatório instaurado para apurar deficiências no atendimento aos migrantes por parte da Polícia Federal no município, foi expedida recomendação para que a DPF em Passo Fundo adotasse as providências necessárias para receber as solicitações de refúgio, acolhida humanitária e afins, sem exercer juízo prévio de admissibilidade dos pedidos, bem como que deixasse de exigir prévia comprovação, no passaporte, de entrada no país pelo local de ingresso, em caso de entrada irregular.
Em resposta, a DPF disse que não acataria a recomendação, alegando que recentes portarias editadas pelo Ministério da Justiça sobre o tema determinariam a impossibilidade de recebimento do pedido de refúgio quando do ingresso irregular de estrangeiro, sendo a Portaria 652/2021 a mais recente. Dispondo sobre a “restrição excepcional e temporária de entrada no país de estrangeiros, de qualquer nacionalidade, conforme recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)”, essa norma infralegal, em seu artigo 8º, determina sanções em casos de descumprimento das medidas, quais sejam, responsabilização civil, administrativa e penal; repatriação ou deportação imediata; e ainda inabilitação de pedido de refúgio.
Em razão da pandemia do novo coronavírus, desde março de 2020, houve a expedição de uma sucessão de portarias interministeriais estabelecendo restrição excepcional e temporária, por rodovias, portos e aeroportos de entrada e saída no país. No entanto, para o MPF, as medidas de combate à disseminação do coronavírus não podem acarretar a supressão de direitos humanos ou a instauração de uma ordem jurídica contrária aos ditames mínimos de um devido processo legal, o que abrange as populações migrantes e o tratamento dado em pontos de fronteira.
Apesar de os Estados, no âmbito do Direito Internacional, terem o poder soberano de regular a entrada de não nacionais, uma resposta eficaz a possíveis ameaças à saúde pública não pode criar obstáculos ou mesmo violar direitos, sejam processuais ou individuais, de pessoas que fogem de seus países de origem em razão de perseguição pelos motivos que acionam as medidas de proteção e salvaguardas previstas na Lei 9.474/1997 e na Convenção sobre Refugiados, de 1951. Nesse sentido, a previsão de “inabilitação de pedido de refúgio” para não nacionais que, descumprindo as medidas excepcionais de restrição disciplinadas nas portarias, entrem no território nacional, não está em conformidade com os padrões de proteção estabelecidos pelo Direito Internacional e mesmo pelo próprio ordenamento interno brasileiro.
O próprio artigo 8º da Lei 9.474/1997 estabelece que “o ingresso irregular no território nacional não constitui impedimento para o estrangeiro solicitar refúgio às autoridades competentes”, o que, segundo o MPF, seria suficiente para derrubar a sanção de inabilitação do refúgio, prevista exclusivamente em atos infralegais.
Assim, no caso concreto, é patentemente ilegal e inconstitucional a conduta da DPF de simplesmente recusar o protocolo dos pedidos de refúgio formulados pelos migrantes com base em portarias, “seja pela flagrante ilegalidade desses atos normativos, seja por exorbitar de suas atribuições ao exercer esse tipo de ‘filtro’”. Também é ilegal que, nos casos de entrada irregular, se exija a prévia comprovação, no passaporte, de entrada no país pelo local de ingresso ou ainda que se negue a possibilidade de o migrante conseguir obter a regularização por outros meios, como a autorização de residência.
De acordo com o MPF, as sanções e o tratamento discriminatório conferido aos migrantes têm propiciado o cometimento de ilegalidades por parte da Polícia Federal em Passo Fundo, que extrai de dispositivos infralegais fundamento para praticar condutas incompatíveis com a legislação e, mais do que isso, atentatórias de normas fundantes da Constituição da República, do Direito Internacional dos Refugiados, do Direito Internacional dos Direitos Humanos, do Estatuto dos Refugiados e da Lei de Migração, podendo inclusive acarretar a responsabilização internacional do Estado brasileiro por graves violações de direitos humanos, o que demanda a intervenção judicial para correção das ilegalidades.
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