MARIANE MANSUIDO
DA REDAÇÃO
Nesta quinta-feira (23/05), a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Sonegação Tributária ouviu representantes de duas instituições financeiras investigadas. A comissão apura possíveis fraudes e sonegações fiscais de empresas de leasing, factoring e franchising com atuação em São Paulo, mas que possuem CNPJ (Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica) registrado em municípios com alíquota menor de ISS (Imposto Sobre Serviços).
Segundo a CPI, essas instituições “simulam” seus respectivos endereços, a fim de pagar menos impostos. A primeira oitiva da reunião foi realizada com dois funcionários do Banco Santander, que foram questionados sobre as atividades da Santander Leasing S.A., instituição do grupo investigada por operações de arrendamento mercantil.
Na semana passada, a CPI intimou sete funcionários do Banco Santander, pela segunda vez. Eles deveriam comparecer à reunião de hoje. Em ofício apresentado aos parlamentares, o gerente jurídico do banco, Guilherme Crispim, advogado da empresa, ficou de intermediar a comunicação do Santander com a CPI para a convocação de funcionários aptos a dar os devidos esclarecimentos.
Segundo Crispim, a sede da Santander Leasing foi transferida para a cidade de Barueri, na Região Metropolitana de São Paulo, em 2001, onde permaneceu até 2017, quanto retornou à capital paulista. Ele também informou que a empresa conta com 20 funcionários, que não estão registrados no CNPJ da empresa de leasing do grupo, mas sim como funcionários do banco Santander.
Coordenadora de operações do Banco Santander, Cátia Nokai também prestou esclarecimentos. Ela é funcionária do banco desde 1997, responsável pela carteira de leasing até hoje. Cátia disse aos vereadores que foi transferida para Barueri em 2001, onde coordenou as atividades, até o retorno a São Paulo. Segundo ela, seus superiores – os gerentes de operação – continuaram na capital paulista, apesar de fazerem visitas à Barueri regularmente.
Questionada pelos parlamentares se a tomada de decisões e as análises de concessão de créditos também eram feitas em Barueri, a executiva respondeu que o setor de leasing sempre foi responsável pela administração das operações, mas que as decisões nunca foram tomadas pela equipe de Barueri.
De acordo com a coordenadora, o setor de análise de risco do Banco Santander, localizado em São Paulo, é o responsável pela análise e decisão de concessão de créditos. E que somente após esse processo as operações eram enviadas a Barueri para assinatura e encaminhamento administrativo.
Na avaliação do auditor fiscal da Secretaria Municipal da Fazenda Marcelo Tannuri, o relato da coordenadora de operações do Santander Leasing é um indício de que as atividades da empresa não foram transferidas integralmente. “É importante saber exatamente onde o serviço está sendo prestado, porque esse será o município que recolherá os tributos. Consideramos que o serviço é prestado onde a decisão é tomada, onde a concessão [do crédito] é feita”, explicou Tannuri.
De acordo com o auditor, a Fazenda não reconhece o procedimento adotado pelo Banco Santander. “Não adianta ter 300 funcionários em um determinado município se, eventualmente, a decisão é tomada em outro lugar. A própria funcionária reconheceu que esse processo decisório não era feito em Barueri, então essa discussão poderá ser muito frutífera para a cidade de São Paulo”, afirmou o auditor.
Confrontada com atas de reuniões, apresentadas pelo Banco Santander aos órgãos de fiscalização, que atestam a realização de assembleias na sede em Barueri, Cátia Nokai afirmou não ter conhecimento de tais assembleias, assim como, de não reconhecer as pessoas que assinaram o documento.
Presidente da CPI, o vereador Ricardo Nunes (MDB) considerou que o depoimento reforçou as suspeitas da comissão. “Após esse relato, com as demais oitivas e a junta de documentos, a nossa tese de que há fraude tributária praticada por essa empresa vem, a cada dia, se concretizando”, disse Nunes.
Decisão judicial favorável
Na manhã desta quinta-feira, foi expedida decisão judicial sobre um mandado de segurança, impetrado pelo Banco Safra, para limitar os poderes de investigação da CPI em relação à Safra Leasing, evitando assim a convocação dos funcionários. No primeiro momento, a Justiça deu uma liminar favorável à empresa, mas em despacho posterior rejeitou o pedido e determinou o prosseguimento dos trabalhos.
Estiveram presentes na reunião de hoje dois dos 17 funcionários intimados da Safra Leasing S.A. Arrendamento Mercantil, empresa do grupo Safra, que também é investigada pela mudança da sua sede para a cidade de Poá (SP), em 2005.
Carlos Pelá, superintendente tributário do Banco Safra, um dos intimados a depor, explicou que a transferência da empresa ocorreu devido a incentivos fiscais em outros municípios, mas que a atividade perdeu o impulso no Brasil. “É claro que a guerra fiscal não aconteceu apenas por conta das alíquotas. Em relação ao leasing, havia uma disputa pelos recursos dessa operação em todo o país, o que o tornou um produto valorizado até certo momento. Diante da insegurança jurídica da atividade, que não justifica os riscos de comercialização, não fazemos mais operações de leasing”, explicou Pelá, segundo quem a empresa ainda possui uma carteira de operações de leasing. “Mas a tendência é chegar a zero no futuro”, complementou.
Para reforçar a queda da atividade, Pelá destacou o número de funcionários da instituição, reduzido de 34, em 2014, para 19, em 2017. A empresa transferiu sua sede novamente para São Paulo, em 2018.
Um dos pontos de investigação da CPI é o local de realização das reuniões da Safra Leasing, antes de retornar à capital. Pelos documentos, elas eram realizadas em Poá, mas nas oitivas de hoje os funcionários atestaram que as reuniões aconteciam na sede do Banco Safra, em São Paulo.
“Eles alegaram que, por lei, as reuniões da empresa não necessariamente deveriam acontecer na cidade de Poá, uma vez que só há um único acionista. Mas essa atitude de alterar o endereço das atas das reuniões e alegar que estavam lá levanta muitas dúvidas, especialmente para a Fazenda”, argumentou o presidente da CPI. “A oitiva tornou a nossa tese mais robusta, de que supostamente existe uma fraude tributária do Safra por simulação de endereço em Poá, para não pagar os tributos para a cidade de São Paulo. Vamos ouvir os funcionários novamente na semana que vem, porque até o momento não estamos satisfeitos com essa defesa”, concluiu Ricardo Nunes.