Em debate sobre os tremores de terra, o afundamento do solo e as rachaduras em vários imóveis do bairro Pinheiro, em Maceió, pesquisadores alertaram que há risco de grandes danos humanos e materiais, principalmente com a chegada do período chuvoso, que começa em abril em Alagoas. Durante audiência pública realizada na Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC), alguns dos participantes pediram a urgente evacuação da população de Pinheiro e das localidades vizinhas, como os bairros Mutange e Bebedouro, mesmo antes da conclusão dos laudos que investigam as causas dos problemas.
Para o coordenador da Defesa Civil de Alagoas, Tenente Coronel Moisés Melo, “está bem claro que é possível haver um desastre como nunca foi visto no país”.
— A Defesa Civil trabalha com a pior das hipóteses. A chuva vai chegar em questão de tempo. Se o gatilho é a chuva, temos que retirar toda a população dessa área — defendeu .
Rachaduras têm surgido em ruas e imóveis da região desde o início de 2018. De acordo com o relatório elaborado pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM), a situação não se estabilizou e, por isso, está sendo monitorada. Segundo o pesquisador e geólogo do CPRM Tales Queiroz, o afundamento do solo está acelerado desde 2017. Ele explicou que parte do solo se move de forma contínua, em movimento de rastejo, mas não descarta que parte do solo se quebre e afunde mais rapidamente.
— Não sabemos hoje se esse rastejo vai evoluir para um movimento mais brusco ao longo de 10, 20, 50 anos ou se já vai se tornar brusco no próximo ano, talvez até mesmo na próxima chuva — advertiu Queiroz.
A área de risco do bairro foi dividida pela Defesa Civil em três cores: vermelha, laranja e amarela. Cada uma representa um grau de risco, sendo a vermelha a mais grave. Porém, de acordo com a recomendação do Ministério Público, as áreas laranja e amarela também deverão ser evacuadas até a área chuvosa.
O senador Rodrigo Cunha (PSDB-AL), presidente da CTFC, recomenda que os moradores não esperem o início das chuvas.
— Se não há condição de antecipar o laudo, nós temos responsabilidade. Algo está acontecendo. Não se sabe quando pode virar um desastre — disse.
Participantes também pediram decretação de estado de calamidade pública no município, reforço dos esquemas de segurança e auxílio-moradia para realocação dos moradores.
Laudo
Os estudos, que devem ser concluídos até o final de abril, avaliam se as atividades de mineração da companhia petroquímica Braskem, que há 40 anos atua na extração de sal-gema na região, estariam relacionadas ao surgimento de fissuras no solo e em imóveis. Também analisa se a exploração de poços pela Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal) teria provocado algum impacto no solo.
O representante da Braskem, Alexandre de Castro, afirmou que empresa vem prestando apoio às autoridades públicas e participado com estudos e ações adicionais para contribuir com as investigações das causas.
Já o assessor técnico da Casal, Jorge Briseno Torres, afirmou que o órgão nunca explorou poços profundos ou galerias subterrâneas na região de Pinheiro. Outras hipóteses que estão sendo verificadas são causas naturais, decorrentes da atividade tectônica no bairro, que tem uma falha geológica.
De acordo com Serviço Geológico do Brasil, só após a conclusão dos estudos será possível avaliar se obras de contenção e drenagem serão suficientes para interromper a movimentação acelerada do solo.
— É preciso que os organismos municipais, estaduais e federal trabalhem desde já para evitar consequência danosa à vida dos seres humanos – disse o diretor de Hidrologia da CPRM, Antonio Carlos Bacelar Nunes.
O diretor-geral da Agência Nacional de Mineração (ANM), Victor Bicca, aponta que várias podem ser as causas do problema:
— O sistema, que estava até então em equilíbrio, se rompeu. Precisamos saber se uma causa prepondera sobre as demais ou se foi o conjunto que causou o rompimento — disse.
Comunidade
Representantes dos moradores de Pinheiro criticaram a atuação das autoridades locais desde as primeiras ocorrências de afundamento do solo na região. Eles não rejeitam a possibilidade de uma evacuação das áreas de risco, mas questionam os termos da operação e pedem mais assistência à comunidade.
— Enquanto o poder público e os governantes não decidirem unir forças e trabalhar em um proposito só, vamos continuar participando de estudos e reuniões e a população vai continuar sofrendo — resumiu Joelinton Góis, do Núcleo Comunitário de Defesa Civil de Maceió (Nudec).
Representante do Movimento SOS Pinheiro, Geraldo Vasconcelos de Castro Júnior, relatou que os moradores do bairro vivem sob constante pressão. Ele considerou que a prefeitura e o governo estadual por se ausentaram da crise, mas ressaltou que o Ministério Público tem prestado apoio. Quanto a uma evacuação, ele demonstra ceticismo.
— Para tirar as pessoas do bairro seria preciso realizar uma operação de guerra. Nossas defesas civis, por mais que tenham boa vontade, não terão condições. Acho que isso é coisa para as Forças Armadas.
Para o presidente da Associação dos Empreendedores do Bairro Pinheiro, Alexandre Sampaio, a polícia não tem estrutura para proteger os estabelecimentos comerciais, que ficariam desguarnecidos no caso de um esvaziamento do bairro. Sampaio destacou que o bairro possui cerca de 2 mil empresas em atividade, que geram mais de 30 mil empregos e movimentam entre R$ 1 bilhão e R$ 1,3 bilhão por ano.
A hipótese de evacuação deve ser tratada com delicadeza, assegurou o diretor do Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres (Cenad), Armin Braun. Ele mostrou preocupação com a “questão psicossocial” que poderia ser provocada pelo abandono forçado das residências.
— As pessoas são apegadas as suas casas, que passaram a vida construindo. Não podemos culpá-las quando elas não querem sair daquela área. Temos que compreender, mas temos que fazer o necessário para retirar.
Poder público
O Ministério Público do Estado (MPE), a Defensoria Pública e o Ministério Público do Trabalho (MPT) explicaram as providências que estão tomando diante da situação. O promotor José Antônio Marques informou que um grupo do MPE vem monitorando o caso e pressionando para a execução de medidas consideradas emergenciais. Entre elas, a desocupação da área crítica e a interrupção do tráfego nas vias e de serviços de gás, água e luz.
Representando o MPT, Rosemeire Lobo destacou que o órgão tem focado sua atenção nos pequenos empresários do bairro, para os quais uma ajuda importante seria a liberação da dívida ativa para que eles possam se beneficiar de linhas de crédito e se estabelecerem em outras localidades. O MPT também acompanha a situação dos trabalhadores do bairro, entre eles os funcionários da Braskem.
A Defensoria Pública trabalha para liberar o aluguel social para os moradores que precisem ou queiram deixar o bairro desde já. O defensor Carlos Eduardo de Paula Monteiro apontou que alguns casos têm sido indeferidos sem motivo claro. Ele explicou que muitos moradores não têm a situação devidamente regularizada, por motivos de usucapião ou herança, por exemplo.