Atividades de reabilitação neurofuncional, curso de Geronto Caratê e projeto Mulheres Empreendedoras estão entre iniciativas do Centro
“Maria Flor é a flor do Centro!” Palavras de uma mãe que há 2 anos e sete meses ouviu a médica dizer que sua filha iria vegetar por conta do diagnóstico de paralisia cerebral, um conjunto de desordens permanentes que afetam o movimento do corpo e a coordenação muscular. Isabelle Dias Castro Garcia conta que a filha nasceu prematura, com 6 meses de gestação (27 semanas), teve três paradas cardíacas, sendo diagnosticada com paralisia cerebral. “Uma médica aqui em Manaus disse que minha filha não ia andar e nem falar. Hoje ela vive uma fase de superação”.
Flor, como carinhosamente chama a mãe, é uma das participantes do Proteger para Incluir, projeto de reabilitação neurofuncional desenvolvido pelo Centro Estadual de Convivência da Família (CECF) Magdalena Arce Daou, situada no bairro Santo Antônio, zona oeste. São atendidos atualmente em torno de 60 pacientes, entre crianças e adolescentes, cujas maiores deficiências afetam a parte neurofuncional.
“Em sua maioria são crianças com paralisia cerebral, outras com dificuldade de locomoção física”, informou a assistente social, Alisilvia Leão Pedroso, assessora da direção do Centro. Segundo ela, trata-se de um projeto de projeção social do Estado, que atua com várias áreas – saúde, assistência, educação e lazer, voltado tanto para pessoas com deficiência como seus familiares que participam de todas as etapas do tratamento.
Como o projeto atua em conformidade com a política do Centro, que é de convivência familiar, Alisilvia Pedroso disse que as ações não são focadas somente na parte da saúde, abrangendo psicologia, fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional, pedagogia e terapia. Há uma oficina específica para os cuidadores que estão diretamente ligados às crianças e adolescentes que precisam de cuidados especiais.
“Os pais ou responsáveis são de grande importância nesse projeto, porque muitos exercícios e movimentos contam com sua contribuição em casa, visando a qualidade de vida da pessoa com deficiência”, informou, destacando ainda que os participantes do programa recebem uma bolsa mensal do Governo Federal oriunda do Benefício de Proteção Continuada (BPC), paga ao deficiente de qualquer idade e ao idoso com 65 anos de idade, no valor de um salário mínimo por mês.
Isabelle Garcia conheceu o projeto neurofuncional em fevereiro do ano passado e, em apenas três semanas, Flor já estava engatinhando, o que não tinha conseguido em um ano e quatro meses. “Aqui ela começou a dar os primeiros passos e hoje está andando, falando, e está superesperta, contrariando todo o diagnóstico que deram para ela”, mencionou a mãe, destacando a gratidão a Deus e à equipe de profissionais do Centro que, além de competentes, são atenciosos e carinhosos com as crianças.
“Flor ainda tem o diagnóstico de paralisia, porque uma vez diagnosticado não some, mas nós nunca desistiremos de fazer o tratamento. Em casa, fazemos todos os exercícios que a doutora ensina, assim como brincadeiras que estimulem o movimento das pernas, dos braços, e o cognitivo também”, completou a mãe, indicando o projeto para outros pais que se encontram nessa situação.
De acordo com a Organização das Nações unidas (ONU), 1 bilhão de pessoas em todo o mundo convivem com algum grau de deficiência, e o Brasil responde por 200,2 milhões desse total. Em virtude da deficiência, em maior ou menor grau, aponta a entidade, essas pessoas passam a ter menos prazer na vida, correm mais risco de morrer prematuramente, têm maior grau de depressão e estão mais dependentes dos outros.
O processo de exclusão social de pessoas com deficiência ou alguma necessidade especial é tão antigo quanto a socialização do homem. Apesar de terem seus direitos garantidos por um conjunto de regras nacionais e internacionais, nem sempre essas normas são colocadas em prática por falta de respeito, verba ou mesmo por desconhecimento.
Movimentação geral
A rotina do CECF Magdalena Arce Daou é bem movimentada e diversificada. O diretor Iramilson da Silva Mesquita, que é psicólogo, disse que o quantitativo diário é relativo, porque depende das atividades, mas em média são mais de mil pessoas que passam pelo Centro, que atende crianças, adultos e idosos com atividades culturais, esportivas, de lazer e cursos profissionalizantes.
No segmento cultural, o CECF oferece teatro, danças em geral – clássica, carimbó, balé, entre outras. No esporte e lazer, tem atividades físicas, incluindo musculação, ginástica funcional e futebol, além de hidroginástica. O segmento de qualificação profissional, por conta do Centro de Tecnologia do Amazonas (Cetam), oferece cursos para área administrativa, coaching, refrigeração, ar condicionado e profissionalizante.
“Tudo isso só é possível graças à ação compartilhada de órgãos como a Secretaria de Estado da Assistência Social (Seas), o grande gestor do Centro na parte psicossocial, da Secretaria de Educação (Seduc), da Secretaria de Cultura (SEC), entre outros”, afirma Iramilson.
Para atender à demanda do projeto de reabilitação neurofuncional, o Centro realiza parceria com as universidades locais e conta com a participação de estagiários na área de Saúde como fonoaudiólogo e fisioterapeuta, bem como em Educação, Pedagogia, entre outros.
“Temos uma parceria com o (Centro Universitário) Fametro, e está prevista para o segundo semestre a entrada da Uninorte (Centro Universitário do Norte) para reforçar nossa equipe”, antecipa o diretor.
Iramilson destaca o tratamento de Maria Flor que, segundo ele, tem uma história bonita porque os médicos haviam diagnosticado, por ocasião de seu nascimento, que ela vegetaria. “O tratamento está provando o contrário”, assinalou.
‘Geronto Caratê’
O público da terceira idade do CECF Magdalena Arce Daou tem uma participação ativa nas atividades do local, inclusive nas artes marciais, que podem ajudar os idosos a se manterem saudáveis física e mentalmente. Um exemplo é o curso de Geronto Caratê, que tem uma clientela diversificada, formada por jovens e idosos.
Um dos participantes é o aposentado Luiz Atlas, 61 anos, que vai fazer dois anos de treinos. Ele conta que, ao se aposentar, ficou parado, além de lesionado, por conta de algumas sequelas adquiridas como professor de Educação Física – hérnia de disco e fratura nos punhos. Resolveu participar do curso e hoje se sente bem disposto.
“O que me deixou feliz foi o fato de o aluno ser aceito do jeito que é: sem braço, sem perna, porque se trabalha dentro do limite de cada pessoa”, disse, acrescentando que também faz caminhadas no local.
O também aposentado Ivo Célio da Silva Lobato, 61 anos, já participava das atividades do Centro, praticando musculação e fazendo caminhada. Como sempre teve vontade de fazer artes marciais, resolveu participar do Geronto Caratê.
“Eu me encontrei na atividade, por ser um esporte fantástico, que exige muito a questão física e mental, o que é uma preparação boa para a velhice”, afirmou, recomendando o esporte para pessoas de todas as idades, por ser saudável para corpo e a mente.
O instrutor Nilton Couto, 34 anos, disse que a equipe é heterogênea, sendo todos os participantes equilibrados em termos de entusiasmo, concentração, porém, os mais velhos têm apresentado maior facilidade de movimentação, coordenação, desempenho e interesse.
“O caratê propicia flexibilidade, força, coordenação, inclusive melhoria cognitiva. No geral, a pessoa fica com melhor qualidade de vida”, garantiu. As aulas de caratê no Centro são realizadas às terças e quintas-feiras, das 8h às 9h30, e à tarde, das 17 às 18h.
Mulheres empreendedoras
Diante de um universo formado por mais de 80% de mulheres, o CECF Magdalena Arce Daou criou várias ações para elas que frequentem o Centro, desde atividades para cuidar do corpo, da mente e do bolso. Aí se inclui o projeto Mulheres Empreendedoras, reunindo mulheres de todas as idades que produzem semanalmente artefatos manuais como pesos de porta, alfineteiros, tiaras, flores, entre outros. As peças são expostas no próprio Centro, todas as quintas-feiras.
A facilitadora Janilde Seixas do Nascimento, que acompanha todo esse trabalho, disse que essas atividades têm se tornado uma terapia. Isso porque, além do aprendizado de um ofício, a atividade promove convivência social, somada ao protagonismo e a autonomia. Elas desenvolvem o artesanato, que é o fuxico, e ficam trabalhando de maneira informal.
“Nas terças, elas se reúnem para produzir várias peças, que são vendidas no Centro e em outros locais, inclusive para vizinhos, parentes e amigos”, informou Janilde. Ela ressalta que muitas mulheres chegaram ao curso com quadro de depressão, e hoje estão praticamente curadas e gerando renda para suas famílias.
Maria Regina da Silva, 70 anos, frequenta o Centro desde 2011 e participa de várias atividades – faz fuxico, pintura, bordado e pedrarias. “Tudo isso é uma terapia para minha cabeça”, disse a aposentada, que se tornou artesã e já trabalha por encomenda. “As pessoas devem procurar uma atividade, porque se torna uma terapia. E, conforme se vai envelhecendo, essa necessidade aumenta, pois precisamos exercitar o cérebro. Saio daqui bem tranquila”, assegurou.
Por sua vez, Maria Antonia Vale da Costa, 56 anos, aposentada e moradora de Iranduba, município a 27 quilômetros de Manaus, vem duas vezes na semana à capital participar do curso, que considera gratificante porque brinca, trabalha e interage com as demais companheiras. Quando foi encaminhada para o Centro, a aposentada, que é mãe de três filhos, estava com início de depressão, decorrente de vários problemas acumulados.
“Ainda me sinto lenta, mas gradativamente estou aprendendo a fazer o fuxico, que não tinha ideia de que era simples fazer”, sintetizou.