A participação social e o fortalecimento dos órgãos colegiados, com foco no Decreto Presidencial 9.759 de 2019, foram discutidos em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), nesta segunda-feira (27). Instituído em 11 de abril, o decreto determinou que, a partir de 28 de junho próximo, serão extintos todos os colegiados da administração pública federal.
Esses órgãos são compostos por membros de representação diversa, que atuam como meios de debate e adoção de políticas públicas, tendo suas decisões sempre vinculadas a um processo legal, que sugere fiscalização, controle ou qualquer tipo de alteração ou proposição na legislação vigente. Geralmente, o processo de atuação se dá com a convocação dos membros para uma sessão, na qual é verificada se há quórum ou algum tipo de impedimento. Depois, são realizadas as discussões, a votação e a divulgação do resultado, nessa sequência.
Presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Fernando Zasso Pigatto, ressaltou que o órgão se posicionou contrariamente ao decreto, apesar de não ter sido diretamente afetado pela medida. Ele elogiou o debate e defendeu a importância da informação e da transparência.
— Se o Conselho Nacional de Saúde não existisse mais, não teríamos um projeto como o que temos com a CGU [Contralaodoria-Geral da União], que vai levar aos conselheiros do país cursos online para a qualificação da participação e do controle social, no quesito transparência na execução dos recursos públicos. Nós precisamos continuar defendendo a democracia — alertou.
O presidente do Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), Leonardo Penafiel Pinho, disse que a discussão sobre o Decreto 9.759 de 2019 é “prioritária”, apesar de o órgão também não ser diretamente afetado pela nova regra. Ele classificou a medida como um “ataque orquestrado” à Constituição.
— Esse decreto ataca, em cheio, a ideia de uma cidadania não amorfa, não falseada, mas uma cidadania ativa, em que o povo brasileiro é convocado a construir, fiscalizar, questionar, a peticionar os órgãos públicos.
A conselheira do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) Aldenora González defendeu a continuidade desses colegiados. Segundo ela, os conselheiros precisam seguir se reunindo, para pautar temas importantes e dialogar com afinidade junto a seus pares.
— É muito grave perceber que, no artigo primeiro desse decreto, nós podemos ser afetados diretamente, com a extinção das comissões do CNAS e de todos os conselhos em que elas não estejam previstas por lei. Não permitir a continuidade do controle social é enfraquecer a democracia — ponderou.
Justificativa
Representante do governo, o coordenador-geral de Combate ao Trabalho Escravo da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, Dante Cassiano Viana, explicou que o decreto foi instituído em razão do alto número de conselhos, o que os tornou “inadministráveis”, e da crise econômica do país, que obrigou o poder público a reduzir gastos. Ele observou que algumas comissões estavam sem funcionamento e não se reuniam há mais de dois anos.
— É muito claro que, sem a participação social adequada, pode-se haver um custo maior, em virtude de decisões equivocadas. Já a participação excessiva, em conselhos muito grandes, também pode resultar em medidas que podem ser muito lentas. Esse meio termo sempre vai gerar discussão e não há uma decisão exata sobre o melhor arranjo, se é que ele existe.
O presidente da CDH e autor do requerimento para o debate, o senador Paulo Paim (PT-RS) agradeceu a atenção do governo em enviar representantes para as audiências públicas da comissão. Ele esclareceu que os assuntos discutidos no colegiado “são sempre uma demanda da sociedade”.
— A nossa responsabilidade e o objetivo final é sempre fortalecer a democracia, numa visão social, que é do que mais padece hoje o mundo — explicou.
e-Cidadania
Pessoas de diversos estados participaram da audiência pública, por meio do canal interativo e-Cidadania. Tereza Rosa Lins Vieira, de Alagoas, ponderou que servidores à disposição dos órgãos colegiados devem ser efetivos e com competência para atuar no controle social e na temática de cada colegiado.
Desiree Biasoli, do Acre, disse esperar que o debate ajude a fortalecer os conselhos “contra a ofensiva de desmonte” recém anunciada. Já Vinicius Beserra, do Maranhão, disse que governos não podem ser guiados por “ideologias factoides”. Para ele, a representação popular deve existir, independentemente de quem está no poder.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)