03/08/2021 – 19:33
Participantes de audiência pública na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (3) apresentaram pontos de vista diferentes a respeito de qual o tratamento legal mais adequado a crimes contra o patrimônio, como furto e roubo. O debate foi promovido pela subcomissão que, no âmbito da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), analisa modificações na legislação penal.
Para Rômulo Luís Veloso de Carvalho, defensor público de Minas Gerais, há um rigor excessivo na legislação no que diz respeito aos crimes contra o patrimônio, com impacto significativo no encarceramento. Hoje, no Código Penal, a pena para furto simples é de reclusão de um a quatro anos, mais multa. No caso do roubo, que envolve ameaça ou violência, a pena é de reclusão de quatro a dez anos e multa.
O furto pode ser qualificado e ter pena de até dez anos também, no caso de subtração de substâncias explosivas. E o roubo prevê possibilidades de aumento de pena em um terço, dois terços e até no dobro, caso a violência ou ameaça seja exercida com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido.
Gustavo Sales/Câmara dos Deputados
Para o defensor público, há um rigor excessivo na legislação a respeito dos crimes contra o patrimônio
Veloso de Carvalho avalia que algumas mudanças poderiam ser positivas, como a redução da pena para furto simples, o fim das qualificadoras e o emprego do mesmo método usado para o crime de roubo — ou seja, estipular casos em que a pena pode ser aumentada. Para ele, penas que podem chegar a dez anos para o crime de furto são muito altas. O defensor faz uma comparação com o crime de tortura, que tem pena de reclusão de dois a oito anos.
Ele defendeu, ainda, a possibilidade de acabar com a punição, caso o autor do crime restitua o dano, e disse que o Estado trata de forma diferente criminosos de diferentes classes sociais.
“Eu cometo um crime tributário, com prejuízo ao fisco e ao erário superlativo, fui descoberto e denunciado. Se eu pago, a minha punibilidade é extinta, inclusive depois de oferecida ação penal e de sentença prolatada. Mas o que esse mesmo Estado penal faz com um acusado de furto de chinelo? A ele não é dado, depois de oferecida uma ação penal, restituir o dano e extinguir punibilidade.”
Crime organizado
Por outro lado, Leonardo Giardin de Souza, promotor de Justiça de Passo Fundo (RS), argumentou que esses crimes contra o patrimônio têm vinculação estrita com o crime organizado. Para ele, o criminoso decide se delinquir e contribuir com a criminalidade organizada.
Giardin afirma que se deve desmistificar a “ideia romântica” de que o criminoso comete o crime apenas por grande necessidade, e entender que ele é um agente racional, que pondera riscos e recompensas.
Gustavo Sales/Câmara dos Deputados
O promotor de Justiça apontou que esses crimes estão vinculados aos crimes organizados
Segundo o promotor, crimes considerados de menor potencial ofensivo, como os furtos, já vêm levando cada vez menos gente à cadeia.
“Os crimes de furto, receptação, estelionato, que são crimes patrimoniais, já estão bastante descarcerizados tanto por institutos antigos — como a possibilidade de oferecimento de suspensão condicional do processo, a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos quando da condenação — como o novíssimo instrumento, colocado pela Lei Anticrime no ano de 2019, que é o acordo de não persecução penal, que atinge crimes sem violência ou grave ameaça com pena mínima até quatro anos”, explicou.
Apesar de discordar de boa parte das ideias do defensor público, Giardin disse concordar que deve haver um parâmetro entre as penas estabelecidas pela legislação. Segundo ele, há uma desproporcionalidade que leva à possibilidade de distorções como, por exemplo, alguém que quebrar o vidro de um carro para furtar algo receber pena similar à dos ladrões que cavaram um túnel para assaltar o Banco Central em Fortaleza, em 2005.
Reincidência
O presidente da subcomissão, deputado Guilherme Derrite (PP-SP), ao direcionar uma pergunta para o defensor Rômulo Veloso de Carvalho, comentou a reincidência em crimes contra o patrimônio.
“De que forma a redução das penas de crimes patrimoniais pode contribuir para a proteção das vítimas? Em São Paulo, por ano, um milhão e meio de crimes são cometidos e por volta de 50% são furtos. E a maioria dos criminosos que cometem o crime de furto é solta ou responde ao crime em liberdade. 70% desses criminosos voltam a cometer novamente o delito de furto, então isso gera uma falta de punibilidade, e um incentivo à vida delituosa”, afirmou.
Segundo Carvalho, é preciso uma avaliação de como trazer racionalidade ao processo criminal. Ele disse acreditar, por exemplo, que pode ser mais interessante, como compensação à vítima, ter a pronta restituição do seu patrimônio ao invés de saber que o criminoso foi preso.
Reportagem – Paula Bittar
Edição – Ana Chalub