O Ministério Público Federal (MPF) no Amazonas entregou ao presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Franklimberg de Freitas, nota técnica assinada por três especialistas em sistemas energéticos de universidades brasileiras na qual apontam a geração de energia solar fotovoltaica centralizada como alternativa para garantir a segurança energética do estado de Roraima.
Segundo o estudo, a linha de transmissão de energia entre Manaus e Boa Vista, que faz parte do chamado Linhão de Tucuruí e vem sendo defendida pelo governo federal como única saída para o problema, não é a opção mais rápida nem mesmo mais barata para oferecer uma solução urgente. A nota técnica é assinada pelo doutor em Planejamento de Sistemas Energéticos pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e professor da Fundação Universidade Federal de Rondônia, Artur de Souza More, pelo doutor em Sistemas de Potência e especialista em Planejamento Energético pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Ricardo J. Fujii, e pelo geógrafo, mestre em Ciências Ambientais e especialista em energia pelo Greenpeace Brasil, Marcelo Laterman Lima.
O documento foi entregue pelo procurador da República Fernando Merloto Soave ao titular na fundação durante reunião realizada ontem (14), na sede do MPF no Amazonas, entre a Funai, a concessionária TransNorte Energia e lideranças do povo Waimiri Atroari. A nota técnica foi repassada também aos representantes da empresa de energia e aos indígenas.
Atraso no procedimento de consulta – Durante o encontro sediado pelo MPF, os indígenas questionaram a falta de observância do cronograma estabelecido para os estudos que precedem a realização do procedimento de consulta prévia. Esses estudos, que ainda não foram concluídos, deveriam estar sendo realizados pela concessionária responsável pelo projeto como etapa prévia do procedimento de consulta aos indígenas.
De acordo com o Diretor Técnico da TransNorte Energia, Raul Ferreira, os trabalhos de planialtimetria não foram finalizados em razão do atraso no repasse de informações técnicas às equipes que se encontravam em campo. Já o Projeto Básico Ambiental, documento que detalha as medidas mitigadoras e compensatórias dos impactos socioambientais, está em fase de conclusão pela Preservar, empresa contratada pelo consórcio para realizar os estudos.
O cacique geral do povo Waimiri Atroari, Mário Parwé, ressaltou que o atraso se deve exclusivamente à referida empresa, não podendo ser imputado aos kinja, como os indígenas Waimiri Atroari se autodenominam. Enfatizou, ainda, que após os estudos deverá ser realizado o procedimento de consulta, nos termos já estabelecidos no protocolo dos índios, já que a implantação da linha de transmissão Manaus-Boa Vista envolve diversos aspectos, inclusive da memória e do histórico de violações do povo Waimiri Atroari.
Os indígenas lembraram que, nos termos constantes do Protocolo de Consulta, ao final dos estudos, deve ser feito o procedimento de consulta propriamente dito, oportunidade na qual os indígenas se manifestarão sobre seu consentimento quanto ao empreendimento, de maneira livre e informada, como determinado na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Segundo o Presidente da Funai, os procedimentos relativos à consulta serão observados.
Histórico do caso – O MPF vem atuando há cerca de uma década neste caso, com vistas a garantir a observância dos procedimentos legais, constitucionais e internacionais relacionados ao direito ao meio ambiente e ao respeito aos direitos dos povos indígenas. O órgão tem destacado em suas atuações que a escolha do traçado em paralelo à rodovia BR-174 não se preocupou em analisar previamente alternativas, menos ainda considerou o componente indígena. Essa definição arbitrária motivou o questionamento da validade do leilão da linha de transmissão, uma vez que o empreendimento foi idealizado de forma viciada, mediante avaliação meramente econômica, que desconsiderou os diversos aspectos socioambientais da região.
Após atuação do MPF, a Justiça já declarou nula a escolha do traçado e do leilão que atribuiu à TransNorte Energia a execução da obra. Para o órgão, o empreendimento foi idealizado de forma viciada, mediante avaliação meramente econômica, que desconsiderou os diversos aspectos socioambientais da região. A questão será apreciada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região.