Leonardo Prado/Câmara dos Deputados
O grupo de trabalho volta a se reunir na quinta-feira para debater o pacote anticrime
A figura de um cidadão informante que colabore com a investigação de crimes de corrupção no Brasil gerou divergências, nesta terça-feira (7), em audiência do grupo de trabalho criado para analisar mudanças na legislação penal e processual.
O chamado pacote anticrime em análise na Câmara dos Deputados (PL 882/19), proposto pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, assegura a qualquer pessoa o direito de delatar, com proteção contra retaliações e preservação da identidade e ainda com a possibilidade de recompensa quando as informações resultarem em recuperação de produto de crime, em até 5% do valor recuperado.
Uma das preocupações da juíza federal em Santa Catarina Claudia Dadico, palestrante na reunião, é a possível criação da figura de um colaborador profissional, principalmente se houver recompensa em dinheiro. “Seria uma profissionalização da atividade do informante, no sentido de instalar uma cultura do denuncismo ou do vigilantismo”, ponderou. Ela também criticou o fato de essa figura estar sendo chamada de “informante do bem”, como se fosse uma antítese de um informante “do mal”.
Preocupação parecida é a do deputado Paulo Teixeira (PT-SP). Ele criticou o fato de o modelo proposto ter sido inspirado na prática de outros países, como os Estados Unidos. “Aqui no Brasil, vai criar uma fábrica de delatores com o objetivo de buscar resultados econômicos”, afirmou. “Já temos uma legislação de combate à corrupção. O que precisamos é criar um sistema preventivo mais eficiente. A pessoa que se arriscar na corrupção deve perder os bens”, defendeu ainda.
Informação reprimida
Favorável à figura do cidadão colaborador, a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) rebateu dizendo que, nos países onde ele existe, não existe uma “indústria do informante”. O argumento dela é que há muita gente com informação reprimida nos órgãos federais, nas polícias e em empresas que poderia estar sendo ouvida em investigações, com a garantia de não serem expostas. Ela própria já recebeu 486 denúncias de corrupção desde o início do mandato.
“O que não dá é a gente pegar essa quantidade gigantesca de pessoas que querem prestar informação de uma forma segura e anônima e simplesmente deixar”, declarou Zambelli. Ela é favorável a recompensas para incentivar quem quiser falar.
O relator do grupo, deputado Capitão Augusto (PR-SP), também se mostrou pelo reconhecimento dos informantes. “Estamos tratando de um câncer no Brasil, que se chama corrupção. Temos como padrão nacional a omissão, as pessoas se calam por medo.”
Critérios
O presidente do Sindicato dos Policiais Federais do Distrito Federal, Flávio Werneck Meneguelli, é da opinião que o pacote anticrime pode ser bom se forem feitos reparos para acabar com pontos subjetivos que dependam de interpretação. Ele defendeu, por exemplo, critérios mais claros para a proteção de informantes ou de policiais infiltrados em facções criminosas.
Sobre a proteção, ele lembra que hoje pode acontecer de se retirar uma família de um local e levá-la para outro, sob a tutela da Polícia Federal. “A pessoa acaba se isolando do mundo para testemunhar contra um crime. Olha que loucura, ela acaba sendo punida indiretamente”, criticou Meneguelli.
O advogado e professor de direito criminal André Callegari, por sua vez, defendeu o estabelecimento de procedimentos para os acordos de colaboração.
Clareza
A coordenadora do grupo de trabalho, deputada Margarete Coelho (PP-PI), recomendou cuidado com práticas importadas de outros países. “Precisamos ter procedimentos claros, que deem transparência e segurança jurídica, a fim de que esses institutos possam adentrar o nosso sistema jurídico sem provocar uma disfuncionalidade”, disse.
O grupo vem se reunindo às terças e às quintas-feiras e deve realizar audiências públicas até a penúltima semana de maio.