Representantes de movimentos sociais criticaram nesta terça-feira (23), em audiência pública, as mudanças administrativas no Poder Executivo feitas pela Medida Provisória 870/2019, a primeira editada pelo governo Jair Bolsonaro. A avaliação deles é que a MP desarticulou órgãos de proteção e promoção de direitos sociais, cujas atribuições foram divididas entre vários ministérios.
A MP reduziu de 29 para 22 o número de órgãos com status ministerial. As mudanças levaram à redistribuição de competências de órgãos.
Radicalização
Para Francisco Urbano, assessor da presidência da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), essa medida provisória é a “sequência da radicalização contra a sociedade organizada”. Ele foi um dos participantes do debate realizado pela comissão mista que analisa a MP 870. Por acordo político, a audiência contou apenas com movimentos contrários ao texto do governo.
As principais críticas foram às mudanças nas atribuições da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). A medida provisória passou a Funai — desde 1990 vinculada ao Ministério da Justiça — para o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MDH). A demarcação de terras indígenas, antes a cargo do órgão, passou para o Ministério da Agricultura, que também ficou com a responsabilidade da titulação de territórios quilombolas, antes feita pelo Incra.
Para os debatedores, as mudanças fragilizam as demarcações e titulações, pois a pasta da Agricultura teria foco no agronegócio, e não em pautas sociais.
Luiz Henrique Eloy, assessor jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), organização não governamental que promove a defesa dos direitos indígenas, questionou a transferência dos órgãos.
— Como vai se colocar a competência para demarcar terras indígenas quando se tem à frente desses órgãos pessoas que são declaradamente contra terras indígenas? Como fica o princípio da imparcialidade? — indagou.
A representante do Conselho Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Givânia Maria da Silva, também criticou o governo por não ter feito consultas às comunidades e povos atingidos antes de editar a MP 870.
Desmonte
Para os parlamentares da oposição, a audiência pública confirmou o “desmonte” que a medida provisória fez sobre a pauta social.
— Parece que esse governo tem alergia ao povo — disse o deputado Bira do Pindaré (PSB-MA).
O senador Rogério Carvalho (PT-SE) disse que o governo está confundindo políticas de governo com políticas de Estado.
— Nós temos um processo evolutivo institucional. A ruptura disso significa terra arrasada. Terra arrasada não interessa a ninguém — afirmou.
Ele também disse que colocar a demarcação de terras indígenas na Agricultura “é um escárnio” do governo.
Pauta vitoriosa
Integrante do partido do presidente Bolsonaro , o deputado Filipe Barros (PR-PSL)) defendeu a reforma administrativa do governo e disse que ela corrobora a agenda vitoriosa na eleição presidencial.
— Precisamos respeitar a visão de mundo que ganhou as eleições desse ano. O que importa não é onde a Funai está, ou quais conselhos serão mantidos —afirmou.
O relator da MP, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), fez uma análise parecida.
— Essa reforma tem amplo apoiamento em diversos segmentos da sociedade, sociedade que assistiu ao inchamento da máquina pública —, disse.
Apesar disso, ele afirmou que pretende construir um parecer com o maior consenso possível, o que implica em mudanças no texto do governo. Bezerra Coelho adiantou uma delas: ele pretende encontrar um novo local para a Coordenação-Geral de Registro Sindical, transferida pela MP do Ministério do Trabalho, que foi extinto, para a pasta da Justiça. Houve críticas na audiência pública a essa mudança. O registro sindical é a inscrição oficial da entidade no âmbito estatal.
— De fato, parece não ser o local mais adequado o registro sindical no Ministério da Justiça— disse.
A comissão realizará outras quatro audiências públicas para ouvir representantes do governo Bolsonaro. O relator entregará o parecer no dia 7 de maio, conforme acertado com os integrantes do colegiado.
Da Agência Câmara Notícias
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)