A retomada do turismo ocorrerá somente após a vacinação massiva da população, exigindo a adoção de novos protocolos de segurança em todo o setor e a redefinição da imagem do Brasil em relação ao mercado externo, visto que o país não atrai nem 1% do fluxo mundial de turistas. Essa foi a avaliação dos especialistas que participaram de mais uma rodada do ciclo de debates sobre a retomada do turismo no pós-pandemia, promovido pela Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo do Senado (CDR), presidida por Fernando Collor (Pros-AL), autor da iniciativa. A discussão nesta segunda-feira (31) teve como tema “O Brasil na retomada do turismo internacional: estratégias para a ampliação de turistas estrangeiros no país”.
Presidente da Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação (FBHA) e representante da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), Alexandre Sampaio disse que a restrição nas fronteiras limitou o trabalho de captação de turistas internacionais. Ele afirmou que houve 88% de queda nas viagens internacionais e na América do Sul, citando dados da Organização Mundial do Turismo.
— A variável de queda não se consegue controlar mesmo com promoção. É um momento delicado para estimular consumidores de mercados internacionais a visitar o Brasil. Se tivéssemos um processo volumoso de vacinação talvez nós tivéssemos recuperação em julho. Estamos com aumento previsto [de chegada de turistas] só de 22%.
De acordo com Sampaio, 20% dos especialistas em turismo sugerem que a recuperação poderia vir a ocorrer apenas em 2022, a partir da adoção de protocolos com países da América do Sul. Segundo ele, o ritmo ainda lento da contenção da covid-19 está gerando uma baixa confiança do consumidor no que se refere a empreender viagens, e a deterioração do ambiente econômico segue como um obstáculo que irá requerer inteligência e inovação para ser ultrapassado.
De acordo com Sampaio, novos protocolos precisam ser implementados, melhor definidos e harmonizados entre diversos países. Ele disse que a biometria será uma solução amplamente aceita, assim como a tecnologia para entrada de dados sem contato, controle de gestos, digitalização de documentos sem toque e comandos de voz, as quais já estão sendo testadas.
Segundo Sampaio, o novo viajante evitará locais superlotados, preferindo o interior e o campo. Além disso, as viagens de carro no modal rodoviário serão percebidas como uma forma mais segura de viajar. Haverá, de acordo com ele, grupos que irão optar por viagens internacionais que não requeiram carteira de vacinação, e a ênfase nas viagens domésticas deverá suplantar as viagens internacionais. Também são esperadas melhorias e inovações em quartos, aviões e qualquer espaço público que receba turistas.
— Tudo isso impactará diretamente na escolha de um destino, voo ou estada. A higiene se tornará um critério tão importante no processo de tomada de decisão do viajante quanto o preço e a localização. É preciso intensificar o marketing digital, otimizar procedimentos de embarque, investir em capacitação sobre protocolos de segurança e higienização, disponibilizar ferramentas de apoio ao empresariado.
Reposicionamento de imagem
Presidente do Fórum Nacional dos Secretários e Dirigentes Estaduais de Turismo (Fornatur) e diretor-presidente da Fundação de Turismo de Mato Grosso do Sul (Fundtur), Bruno Wendling declarou que o Brasil precisa reposicionar a sua imagem no mercado internacional, focar na inovação de novas ofertas e desenvolver soluções tecnológicas inéditas.
— De fato, é preciso mudar a imagem que o Brasil vem trabalhando há décadas e não é alterada no mercado internacional. Não vejo isso na composição da imagem do destino Brasil. A gente deve fazer uma ação coordenada. A vacinação precisa ser acelerada e ampliada para que a população tenha segurança em viajar. Mas é preciso reconstruir a imagem do Brasil, definir segmentos-âncora, os mercados prioritários e quais destinos brasileiros que o mercado emissor quer consumir. É preciso a adoção de planejamento estratégico, a definição de estratégias para redefinir produtos. Continuamos vendo os mesmos destinos trabalhados no mercado internacional — alertou Wendling.
Segurança
Diretor-presidente da Agência Brasileira de Promoção Internacional de Turismo (Embratur), Carlos Brito disse que, embora o turismo no Brasil tenha sido duramente afetado pela pandemia, assim como em outros países, o prejuízo poderia ter sido maior se o governo não tivesse tomado medidas adequadas. Ele afirmou que o Brasil foi um dos dez primeiros países do mundo a lançar o selo Turismo Responsável, como forma de permitir a realização com segurança de atividades ligadas ao setor,
— Até 85% dos voos domésticos em operação estavam em operação em dezembro passado; fomos afetados pelo início do segundo ciclo da pandemia. A Embratur realizou campanha para incentivar o turismo nacional. O Brasil tem vacinado rapidamente. Esperamos que a população economicamente ativa esteja vacinada até setembro de 2021. Somos o quarto país do mundo que mais ofereceu doses da vacina. À medida que mais brasileiros tenham sido vacinados, as atividades de turismo serão mais viáveis, com a reabertura de fronteiras e o retorno gradual de turistas.
Para a retomada do turismo internacional, o presidente da Embratur disse que está prevista a participação do Brasil em feiras a serem realizadas na América Latina, em Londres, em Las Vegas, em Xangai e em Barcelona, embora haja imprevisibilidades em decorrência da pandemia. Estão previstos ainda a ativação de 15 mercados prioritários, eventos internacionais com jornalistas e influenciadores, abertura de unidades da Embratur em cada continente, além de ações de cooperação com a Espanha e a China.
— O motivo de o Brasil não ser tão competitivo é a falta de recurso. A Embratur tem potencial enorme, mas fica limitada a recursos que ela possui para a promoção do Brasil no exterior. A briga lá fora é de cachorro grande. Temos que colocar o Brasil na prateleira que ele merece. O Brasil tem a bola da vez.
Governança
Presidente da Empresa Potiguar de Promoções Turísticas (Emprotur-RN), Bruno Reis disse que o desafio em turismo sempre vai ser a governança e o desenho de políticas em que os interesses públicos e privados tenham convergência.
— Uma grande interrogação é como a gente vai se posicionar quanto à oferta hoteleira. Sempre fomos considerados um mercado exportativo. A gente tem que organizar e mostrar os dados de forma organizada. Sinto falta de campanha de recall da marca da Embratur, se de fato ela se conecta com turistas, operadores, companhias aéreas. A promoção de um destino não se resume só a participação em feiras. São essas ferramentas que têm que ser geridas para que a gente tenha penetração nesses mercados de forma mais organizada — argumentou Reis.
Superintendente do Maceió Convention & Visitors Bureau (MC&VB), Danielle Govas Pimenta Novis cobrou a adoção de inteligência comercial, além da mensuração dos resultados das métricas a atingir e mecanismos de inovação no setor de turismo.
— Essa pandemia dará a condição de o Brasil se reposicionar como destino turístico. É preciso trabalhar de forma integrada as regiões, formatar produtos, oferecermos o Brasil ao turista estrangeiro com uma permanência maior. Há espaço para trabalhar os roteiros domésticos, mas só vamos avançar com a vacinação. Estamos atrasados, há restrições. Mas por que o setor de turismo não foi contemplado no programa de imunização? Senti falta dessa estratégia. É preciso adotar estratégias diferentes e atrativos comerciais — afirmou Danielle.
“Renascimento”
Presidente da União Nacional de Conventions & Visitors Bureaus e Entidades de Destinos (Unedestinos), Toni Sando de Oliveira disse que o setor de turismo viverá seu melhor momento da história, pois, depois de tanto tempo confinadas em suas casas, as pessoas vão querer viajar. Segundo ele, “seremos todos tomados por um forte desejo de explorar e descobrir o mundo”.
— O turismo viverá uma renascença após a pandemia e seremos o setor que mais vai prosperar, porque somos uma indústria toda baseada no contato humano. Entraremos em uma fase histórica, onde isso será valioso e precioso. Nossa hospitalidade dará boas-vindas a todos, com nossa alegria e simpatia, típicas do brasileiro. E o turismo virá com uma só voz: ‘Sejam todos bem-vindos ao novo mundo’. Assim que a pandemia acabar, estaremos presentes na vida das pessoas criando momentos inesquecíveis. Por isso é importante trabalharmos em união para fazer a retomada rapidamente, sem voltar para o passado, dando um salto para o futuro. O ano que vem será simbólico. Serão os 100 anos da Semana de Arte Moderna de 1922 e haverá o bicentenário da Independência do Brasil. Será preciso viajar, para perto ou longe, sozinho ou em família, para qualquer lugar — declarou Toni, após traçar um paralelo entre a pandemia da covid-19 e o mundo que surgiu após a gripe espanhola, em 1918.
Ao comentar a fala de Toni Sando, Collor disse que a exposição do representante da Unedestinos apontava para um futuro auspicioso no que diz respeito ao Brasil, ao contrário de previsões menos otimistas de especialistas vários setores. Na avaliação do senador, o avanço da imunização e a adoção de rigorosos protocolos de biossegurança serão condições essenciais para a retomada do setor. Collor considera ainda que a recuperação da atividade turística avancará paralelamente ao recuo da pandemia, e, “para isso, só havendo vacina no braço, comida no prato e carteira assinada”.
— Há previsões, de quem prenunciava desastre econômico para o final deste ano, que já anunciam que teremos um crescimento que poderá chegar a 5%; a inflação ficará dentro da meta estabelecida; teremos a maior receita do agronegócio da história; condições de empregabilidade maior. Nós teremos condições, sim, de pensar com otimismo, que nos deve contaminar, e não esse vírus, que nos deixa com pensamento pessimista com a perspectiva de um mundo mais egoísta e isolado. Estamos lidando com o imponderável, com o vírus e as variantes que ameaçam chegar, e isso nos traz desassossego. Mas há possibilidade de trazer vacinas para todos e teremos condições de sair, sim, do momento em que nos encontramos — disse Collor.
Internautas
Antes do encerramento do debate, Collor leu as perguntas encaminhadas por internautas e dirigidas ao presidente da Embratur. O senador destacou que o debate desta segunda-feira (31) foi o que, até agora, registrou a maior participação do público virtual, com mais de cem pessoas.
Sônia Santana de São Paulo, por exemplo, questionou os mecanismos de controle e a ação para impedir turistas estrangeiros de entrar no Brasil sem triagem. Jeová Chagas, de Minas Gerais, indagou se o momento atual seria adequado à retomada do turismo, diante do surgimento de novas variantes da covid-19. Em resposta aos internautas, Carlos Brito ressaltou que a vacinação é a solução para a retomada do turismo em todos os níveis.
— Saúde e turismo andam juntos. Nós acreditamos que logo teremos a maior parte do país vacinada. Estamos vendo o número crescer diariamente, e acreditamos no governo federal e no Ministério da Saúde, que estão trabalhando diuturnamente para resolver os gargalos — respondeu o presidente da Embratur.
O ciclo de debates sobre o turismo no pós-pandemia, promovido pela CDR, ocorre às segundas-feiras. A próxima audiência pública, a ser realizada em 7 de maio, terá como tema a participação dos bares e restaurantes na retomada do turismo, e contará com a participação de representantes desses setores.
Ao todo, estão previstos oito encontros — com o debate desta segunda, já foram realizados quatro. A abertura ocorreu em 10 de maio, com as mesas-redondas sobre “Os efeitos da pandemia sobre o setor de turismo no Brasil, cenário atual e perspectivas” e “Os efeitos da pandemia sobre os segmentos de resorts e hotéis no Brasil: panorama atual, desafios e perspectivas”. O segundo debate ocorreu em 17 de maio e teve como tema “Os Efeitos da Pandemia sobre o Segmento de Eventos Corporativos: panorama atual, desafios e perspectivas”. Em 24 de maio foram debatidos os temas “Setor aéreo e turismo: cenário atual e desafios para o período pós-pandemia” e “Segmento das operadoras, agências e navios de cruzeiros: cenário atual e desafios para o período pós-pandemia”.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)