Foi sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro a Política Nacional de Busca de Pessoas Desaparecidas (lei 13.812, de 2019), aprovada pelo Senado em 20 de fevereiro. Na sanção, Bolsonaro vetou o prazo de 90 dias para que o Executivo regulamente a lei, ou seja, o cumprimento do que está previsto no texto pode demorar mais para passar a valer.
Bolsonaro alega que, ao estabelecer o prazo, o Congresso violou a independência dos poderes. “Ao fixar o prazo de 90 dias para que o Poder Executivo exerça a função regulamentar, o projeto de lei além de restringir o exercício de um poder administrativo para além das hipóteses constitucionalmente previstas, infringiu o princípio de harmonia e independência entre os poderes, na esteira da jurisprudência do STF”, diz o veto.
Ainda não está marcada a sessão conjunta em que senadores e deputados devem decidir se mantêm ou derrubam o veto. Para derrubá-lo, é necessário que a maioria tanto dos deputados quanto dos senadores se posicionem de maneira contrária ao entendimento da presidência da República.
Na prática, o veto adia indefinidamente o cumprimento do que está na nova lei. O texto prevê ações articuladas do poder público e a reformulação do Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas. De autoria do ex-deputado Duarte Nogueira, ele foi aprovado na Câmara em 2017 na forma do relatório da então deputada Eliziane Gama, atual senadora pelo PPS do Maranhão.
Eliziane disse que estranhou o veto e considera que ele seja, na verdade, um veto total.
— Para mim está claro que o governo não vai implementar essa política nunca — desabafou.
O indício, segundo ela, foi a tentativa feita pelo governo de retirar a matéria de pauta quando ainda estava sendo votada no Plenário do Senado. Para a senadora, o governo estaria criando um artifício para postergar essa lei e possivelmente não implantar, “não fazer valer de fato”.
Sobre a razão do veto, Eliziane comentou ser natural que o Congresso estabeleça um prazo de vigência:
— Quando isso não acontece fica subentendido que são 45 dias para a lei entrar em vigor. Demos o dobro do prazo, e mesmo assim o presidente acha de vetar.
Eliziane diz ser frustrante porque, segundo ela, milhares de famílias brasileiras aguardam respostas sobre seus desaparecidos. A senadora acredita que o Cadastro Nacional de Pessoa Desaparecidas, criado em 2009, pode ser melhorado se a lei efetivamente entrar em vigor. Ela cita que são quase 700 mil pessoas desaparecidas no país, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A lei também coloca o Brasil apto a fazer convênios com órgãos internacionais de busca, como a Interpol.
Pela nova lei, o atual Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas terá um banco de informações públicas (de livre acesso por meio da internet), com informações básicas sobre a pessoa desaparecida; e dois bancos de informações sigilosas, um deles contendo informações detalhadas sobre a pessoa desaparecida, e o outro trazendo informações genéticas da pessoa desaparecida e de seus familiares.
Essas informações deverão ser padronizadas e alimentadas por todas as autoridades de segurança pública competentes para a investigação. Hospitais, clínicas e albergues, sejam públicos ou privados, deverão informar às autoridades o ingresso ou cadastro em suas dependências de pessoas sem a devida identificação. Para ajudar na localização, o governo poderá promover convênios com emissoras de rádio e televisão para a transmissão de alertas urgentes de desaparecimento.
— As famílias têm pressa. Cada momento e cada hora é a dor de uma mãe e de um pai que não sabem onde é que está o seu filho ou onde está sua mãe. […] E é terrível, é dolorido, corta a alma você ouvir o depoimento desses pais e dessas mães. Sabe por quê? Porque hoje você tem um cadastro inexistente. Porque você faz a implantação de um dado e você não tem nenhum tipo de alimentação — diz Eliziane.
A nova lei também prevê o desenvolvimento de programas de inteligência e de articulação entre órgãos de segurança pública desde o desaparecimento até a localização da pessoa; sistemas de informação e comunicação entre os órgãos e de divulgação de informações sobre desaparecidos. Haverá investimento em pesquisa e desenvolvimento e capacitação de agentes públicos, e o governo deverá criar redes de atendimento psicossocial aos familiares de pessoas desaparecidas.
Ainda de acordo com a lei, a autoridade competente deverá incluir todos os dados no cadastro nacional assim que receber uma denúncia de desaparecimento. Essas informações também serão inseridas em outros bancos de dados, como a Rede de Integração Nacional de Segurança Pública, ou outro sistema nacional.
A autoridade de segurança pública também terá condições, após autorização judicial, de acessar dados de aparelho de telefonia móvel caso haja indícios de risco à vida do desaparecido. Se o caso envolver criança, adolescente ou vulnerável, a investigação começará imediatamente após a notificação, sem a necessidade de se esperar qualquer prazo para configurar o desaparecimento.
O texto sancionado também prevê a realização de um relatório anual com as estatísticas sobre os desaparecimentos e casos solucionados.
Com informações da Agência Câmara