Ética judicial e combate à corrupção foram os dois primeiros temas discutidos no seminário O Poder Judiciário nas relações internacionais, realizado em Brasília nesta quinta-feira (4) no contexto das comemorações dos 30 anos do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O evento contou com a participação de delegações de 14 países e também da Organização das Nações Unidas (ONU).
No painel, que discutiu panoramas e perspectivas sobre a ética judicial, o ministro do STJ Herman Benjamin disse que é fácil apresentar ideias gerais a respeito do assunto, já que todos são a favor da existência de valores éticos no Poder Judiciário.
O desafio, segundo o ministro, é quando a discussão aborda a prática cotidiana dos magistrados; nesses casos, é preciso distanciamento para não ficar preso às convicções pessoais. “Nós, magistrados, julgamos as causas e depois somos objeto de juízo ético por parte da sociedade”, destacou Herman Benjamin ao propor a defesa de valores éticos bem definidos, como forma de assegurar o Estado de direito frente à sociedade.
Os dilemas éticos surgem das formas mais variadas, segundo o juiz do Tribunal Supremo da Espanha Wenceslao Olea Godoy. Um desses desafios é a participação dos magistrados em redes sociais. Ele relata que, desde a criação de uma comissão de ética judicial, esse é um dos temas que mais têm gerado questionamentos no âmbito do Judiciário espanhol. “A discussão é fundamental para manter o prestígio de um poder que muitas vezes é o último reduto de defesa da dignidade de uma pessoa”, afirmou o magistrado.
Exposição pública
Outro ponto citado pelos expositores como conturbado no âmbito da ética profissional é a exposição do magistrado na sociedade, principalmente frente às pressões da opinião pública. O ministro do STJ Ribeiro Dantas disse que uma das formas de manutenção de padrões éticos é o julgamento de causas de acordo com o império da jurisprudência.
“A percepção de independência para o julgamento não pode ser absoluta. Cada vez mais os juízes aplicam princípios, e corremos o risco de perder a segurança jurídica. Precisamos de juízes com o espírito de Ulysses, que se amarram na legalidade sem se curvar à opinião pública.”
O presidente da Corte Suprema de Justiça do Paraguai, Eugênio Rolón, afirmou que, apesar das pressões públicas, os magistrados não devem se esconder. Ele mencionou esforços da corte paraguaia para fortalecer a instituição, incluindo a adoção de medidas de transparência total, como a realização de sessões públicas transmitidas pela televisão.
Além dos ministros Herman Benjamin e Ribeiro Dantas, participaram da mesa o presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha; a vice-presidente, ministra Maria Thereza de Assis Moura; e o ministro Moura Ribeiro.
Combate à corrupção
No período da tarde, o seminário prosseguiu com o tema “Poder Judiciário e combate à corrupção”. O primeiro a palestrar foi o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, que fez um panorama das recentes ações ligadas ao combate à corrupção, além de destacar as mudanças pelas quais o país passou em relação à forma de encarar esse tipo de ilícito.
Para o ministro, o Brasil mudou de um país com um processo penal deficiente, com pouca efetividade nas investigações, para um país em que até autoridades são presas por prática de corrupção. “Algo mudou. Pode-se dizer que o julgamento da Ação Penal 470, em 2012, pelo STF – o chamado mensalão – foi um marco.”
Moro também lembrou o sucesso da Operação Lava-Jato e ressaltou a importância da cooperação internacional no combate à corrupção, especialmente com a troca de informações.
Experiências
Em seguida, o presidente do Tribunal Supremo de Moçambique, Adelino Manuel Muchanga; o presidente do Supremo Tribunal de Justiça do Timor Leste, Deolindo dos Santos; e o juiz da Corte Suprema de Justiça de El Salvador Carlos Ernesto Sánchez Escobar falaram a respeito das experiências de seus países no combate à corrupção, apesar das dificuldades enfrentadas em razão de extrema desigualdade social ou de sucessivas crises político-militares. “A corrupção mina o Estado, corrói os alicerces da democracia”, afirmou Deolindo dos Santos.
O primeiro presidente adjunto da Corte de Cassação da Itália, Domenico dos Santos, citou a evolução penal ocorrida no país com vistas ao combate sistêmico da corrupção, inclusive dentro do Poder Judiciário. “Nós percebemos que a corrupção não é apenas um ato, mas uma atividade contínua, que é preciso combater.”
O papel do Judiciário
Também compuseram a mesa do painel o presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha; a vice-presidente, ministra Maria Thereza de Assis Moura; o corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins; e os ministros Sebastião Reis Júnior e Rogerio Schietti Cruz.
Os magistrados destacaram o papel do Poder Judiciário no combate à corrupção, por meio de ações que prezem pela ampliação da transparência e eficiência em suas decisões. “O Brasil tem feito seu papel no cenário nacional e internacional, inclusive se reestruturando internamente, em prol do combate à corrupção”, disse Humberto Martins.
Os ministros apontaram ainda a imprescindibilidade da cooperação jurídica e do respeito aos direitos fundamentais, a fim de viabilizar uma melhor gestão no combate a esse tipo de crime, com um Judiciário imparcial, que preserve o devido processo legal e concomitantemente entregue uma prestação jurisdicional adequada.
O ministro da Justiça, Sergio Moro, e o presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha, participam do painel que discutiu o papel do Judiciário na luta contra a corrupção.