A mineradora Vale informou que já foram feitos pagamentos emergenciais a cerca de 800 atingidos na tragédia de Brumadinho (MG), conforme estabelecido no Termo de Ajuste Preliminar (TAP) firmado no dia 20 de fevereiro. O acordo prevê que as vítimas do rompimento da barragem, ocorrido no dia 25 de janeiro, recebam mensalmente valores que levem em conta os seguintes critérios: um salário mínimo por adulto, meio salário mínimo por adolescente e um quarto de salário mínimo por criança.
Têm direito ao pagamento os moradores de Parque da Cachoeira e Córrego do Feijão, comunidades de Brumadinho que foram afetadas, e nas localidades que estiverem a menos de um quilômetro do leito do Rio Paraopeba até a cidade de Pompéu (MG). As quantias serão pagas durante um ano. Cada família receberá ainda, nesse mesmo período, a quantia mensal de R$ 405,40 referente a uma cesta básica. O depósito será feito na conta que for cadastrada como sendo do responsável pelo núcleo familiar.
A Vale anunciou o início dos depósitos na última sexta-feira (15). “Não temos a confirmação de quantos já receberam, pois ainda está em compensação bancária, que pode demorar até três dias”, informou hoje (18) a mineradora à Agência Brasil. De acordo com a mineradora, esses primeiros pagamentos foram feitos aos moradores de Parque da Cachoeira e Córrego do Feijão. Ainda não foi divulgada data para que os atingidos das demais localidades recebam o recurso. O processo de registro desses atingidos será definido em uma audiência judicial na próxima quinta-feira (21).
Moradores das duas comunidades de Brumadinho que ainda não se habilitaram para receber os valores ou que ainda têm pendências no registro devem marcar horário para entrega da documentação por meio do telefone 0800 888 1182. Entre os documentos necessários estão dados da conta bancária, CPF e carteira de identidade ou certidão de nascimento, no caso de menores de 18 anos. Também é preciso apresentar um comprovante da residência situada na área afetada, que pode ser contas de luz e de água ou registro de matrícula escolar, entre outros. A partir da próxima quarta (20), postos de atendimento começarão a funcionar nas duas comunidades.
Natureza Indenizatória
O TAP foi proposto à Vale por diversas instituições: Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Defensorias Públicas do estado e da União e Advocacia-Geral do estado e da União. A assinatura se deu após negociações ocorridas em várias audiências conduzidas pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). No entanto, pesa uma divergência acerca da natureza desses pagamentos definidos no TAP. “O acordo com autoridades competentes permite antecipar o pagamento de indenizações emergenciais, lembrando que poderá ser deduzido da indenização definitiva”, diz a Vale.
Esta opinião não é compartilhada pelo MPF. Segundo o órgão, a dedução não pode ocorrer, conforme estaria estabelecido em uma cláusula na ata da primeira audiência realizada no TJMG. Por sua vez, o MPMG apresenta um terceiro ponto de vista sobre a questão. “A Justiça deixou essa definição em aberto para avaliação futura, a partir das indenizações que forem pedidas/deferidas”, informou em nota.
A avaliação do defensor público de Minas Gerais, Antônio Lopes de Carvalho Filho, vai ao encontro da posição da mineradora. Para ele, os pagamentos emergenciais têm natureza indenizatória. “Essa é uma construção um pouco nebulosa. Pelo que está construído na decisão judicial, eu entendo que esse pagamento será abatido nas indenizações. Mas há algumas interpretações respeitáveis, segundo as quais ele não será abatido”, diz. De acordo com o defensor, um trecho de ata da audiência define que os valores são antecipações da indenização. “Não acho que é um problema de clareza e sim um problema de interpretação”, acrescenta.
A divergência acerca da natureza dos pagamentos emergenciais também existe no caso da tragédia de Mariana (MG), ocorrido em novembro de 2015, a partir do rompimento de uma barragem da mineradora Samarco. A questão está inclusive judicializada. O Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC), assinado em março de 2016 entre a Samarco, suas acionistas Vale e BHP Billiton, o governo federal e os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo, elenca as ações voltadas para a reparação dos danos da tragédia e, entre suas medidas, estabelece o pagamento de um auxílio emergencial aos atingidos correspondente a um salário mínimo, acrescido de 20% por dependente, somado ao custo de uma cesta básica.
No final do ano passado, a Justiça Federal havia concedido em primeira instância uma liminar à Samarco, autorizando a deduzir os valores já pagos das indenizações. A decisão contrariou pescadoresque recebem o benefício em diversos municípios da bacia do Rio Doce, que organizaram um protesto. Em fevereiro deste ano, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região derrubou a liminar. O mérito da questão ainda será julgado.
Outros compromissos
Além do pagamento emergencial, o TAP fixa a obrigação de a mineradora custear a contratação de assessoria técnica independente para fornecer suporte às pessoas atingidas pelo desastre ambiental. As próprias vítimas escolherão as entidades que vão atendê-las. Assessorias técnicas independentes já prestam assistência aos atingidos pela tragédia de Mariana, onde a obrigação de arcar com os custos da contratação é da Samarco.
A empresa também concordou em quitar o valor das multas aplicadas pela Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais (Semad), que giram em torno de R$ 99 milhões. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) também aplicou multas, que somam cerca de R$ 250 milhões.
Outro compromisso assumido pela Vale diz respeito ao ressarcimento dos cofres do estado de Minas Gerais por todos os gastos emergenciais efetuados em decorrência do rompimento da barragem. Em relação à Brumadinho, o prefeito Avimar Barcelos anunciou na semana passada que chegou a um acordo com a mineradora para que seja mantido, por pelo menos mais dois anos, pagamento equivalente ao Imposto Sobre Serviços (ISS) e à Contribuição Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), tributo conhecido como o royalty da mineração.
Com as operações da Vale paralisadas, o município temia perder receita de R$ 80 milhões nos próximos dois anos. Segundo o prefeito, mesmo com a produção interrompida, a mineradora vai assegurar esse recurso na forma de uma doação.