NATALIA DO VALE
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“Violência contra a Pessoa idosa: é preciso se importar” foi o tema de mais uma edição do projeto Envelhecimento em Pauta. O encontro foi realizado de forma virtual na manhã desta segunda-feira (14/6) é de iniciativa da vereadora Cris Monteiro (NOVO).
A parlamentar abriu a reunião saudando os convidados e falando da importância de debater os desafios que cercam o envelhecimento saudável: “Todos nós vamos envelhecer e queremos que isso aconteça com dignidade, viver a velhice com cuidados, atenção e respeito devidos por isso estamos aqui. Obrigada a todos os convidados”.
Convidados
O debate foi coordenado por Carlos Lima, o psicólogo e mestre em gerontologia, e contou com a presença de Ione Amorim, coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do IDEC (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), Maria Cecília de Souza Minayo, socióloga, antropóloga e doutora em Saúde Pública, e Marília Viana Berzins, doutora em Saúde Pública e Presidente do OLHE (Observatório da Longevidade Humana e Envelhecimento).
Dia Mundial de Conscientização da Violência contra a Pessoa Idosa
A data foi criada em 2006 pela ONU (Organização das Nações Unidas) e pela Rede Internacional de Prevenção à Violência à Pessoa Idosa com o objetivo de promover a conscientização sobre o crescente número de idosos que são acometidos por algum tipo de violência e acender a discussão em busca de recursos e estratégias que atuem de forma a proteger os idosos.
Combate à violência
O primeiro a falar foi o psicólogo e mestre em gerontologia, Carlos Lima, que ressaltou a importância de discutir a violência contra o idoso em qualquer data, mas em especial em uma semana tão importante que marca essa luta: “Esse evento é muito simbólico realizado nesta semana em que temos o Dia Mundial de Conscientização da Violência contra a Pessoa Idosa. É um tema quase invisível, que muitas vezes silenciamos, mas que precisa ganhar mais destaque na sociedade. Esse encontro é muito pertinente neste sentido”, afirmou.
Participante da reunião, Marília Viana Berzins fez um breve resumo sobre a criação da data e dos avanços e desafios que cercam este tema: “O primeiro dia de conscientização da violência contra a pessoa idosa foi criado pelas Nações Unidas e começou em 2006. Naquele ano éramos poucos profissionais que se juntaram para iniciar esse trabalho. Passados 15 anos, esse evento é uma realidade na agenda pública e promoveu avanços importantes. Temos pesquisas, leis, cartilhas que chamam a atenção para este tema e vamos continuar lutando para que envelhecer com dignidade seja um direito humano fundamental. Só para vocês terem ideia, estima-se que uma a cada duas pessoas no mundo tem atitudes discriminatórias que prejudicam a qualidade de vida dos idosos. Não podemos aceitar que ninguém, seja em que âmbito for, desrespeite os direitos dos idosos. As pessoas não enxergam, mas uma ofensa aparentemente banal é uma violência e causa danos”, explicou a presidente do OLHE.
Violência autoprovocada
Uma das violências discutidas durante a reunião foi a autoprovocada, que acontece com tentativas de suicídio e outras formas de ferimentos na terceira idade.
Para tratar deste assunto, Maria Cecília de Souza Minayo, socióloga, antropóloga e doutora em Saúde Pública trouxe uma apresentação com estudos e gráficos que apontam a gravidade do problema em nossa sociedade. “A população acima de 60 anos hoje é a que mais cresce no Brasil e no mundo. São 34 milhões de idosos em nosso país e o crescimento das taxas de suicídio nesta faixa etária é assustador. Quando a gente estuda o suicídio de jovens e população adulta percebemos uma taxa grande de tentativas que não se concretizam. Já nos idosos essa taxa é inversa. Na população em geral. 4,5% acabam de fato concretizando o ato, já nos idosos são mais de 8% a cada cem mil habitantes, quase o dobro de suicídios cometidos. E em algumas regiões, como no Sul do país, a taxa está acima de 20%. É um fenômeno que precisa ser compreendido para que possamos atura e combater esse problema grave”, pontuou a especialista.
Fatores de risco
Seguindo sua apresentação, Maria Cecília apontou os principais fatores que levam um idoso a cometer suicídio. Dentre as causas mais recorrentes estão: fatores médicos (doenças crônicas ou terminais, problemas que comprometem a cognição ou a locomoção), psiquiátricos (depressão, confusão mental, psicose, abuso de álcool e drogas), psicológicos (sentimento de solidão, inutilidade e infelicidade), fatores familiares (perda de pessoas importantes e abusos como exploração do tempo e da rotina do idoso por parte dos filhos e netos), violência física e violência patrimonial.
“Quando falamos de suicídio não estamos falando de morte e sim de vida, de problemas que levam alguém a querer morrer. O suicídio é resultado de um sofrimento insuportável que leva alguém a querer não viver mais. O que leva uma pessoa idosa a querer tirar a sua própria vida? Perda de renda, aposentadoria e com isso perda de funções e ocupação, mas o principal de tudo, a perda dos laços afetivos com seus familiares e amigos, não à toa as pessoas que vivem em lares de idosos são as mais vulneráveis”, pontuou Maria Cecília.
Prevenção
Para a doutora em Saúde Pública o suicídio é prevenível e por isso precisa ser discutido: “Ninguém merece morrer ou sofrer por ser idoso. As famílias e a sociedade podem e devem dar mais atenção a este tema. Evitando as causas e com ações básicas podemos evitar muitas mortes. Ter uma rede de apoio familiar e/ou comunitária diversificada e acesso a acompanhamento profissional quando necessário são dois pontos que coloco como bons passos para prevenção”, explicou.
Carlos Lima elogiou a apresentação da colega e destacou a importância da discussão como agente de prevenção: “Informar também é prevenir. Sua fala rompe o silêncio e traz à tona algo que a gente esconde debaixo do tapete e que precisa ser dito, discutido e pensado. Falar sobre este tema por si só já é um jeito de prevenir e te agradeço por isso”.
Violência financeira
Uma das violências mais comuns sofridas pelos idosos, segundo os convidados presentes, é a patrimonial, que em geral acontece por meio de empréstimos consignados e endividamento desnecessários.
Participante da reunião, Ione Amorim, coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do IDEC (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), falou sobre a gravidade deste problema: “O crédito consignado é um dos maiores motivos de endividamento dos idosos hoje no país e a maneira como as operadoras financeiras agem para assediar os idosos é criminosa. Existem idosos que têm até 40% de sua renda comprometida com este tipo de empréstimos e muitas vezes esse dinheiro é creditado em conta sem que o idoso tenha solicitado. Ele nem sabe de onde o dinheiro veio e acha que é depósito do próprio INSS. As reclamações de idosos com crédito depositado na conta sem aceitação ou solicitação cresceram 440% de outubro de 2020 para cá”, conta a coordenadora do IDEC.
Assédio contínuo e diário
Ione Amorim explica que a chegada do crédito consignado no país possibilitou ao sistema bancário um acesso muito grande aos dados dos idosos e a maneira indutiva como o crédito é oferecido tornou-os reféns das instituições bancárias: “Os correspondentes bancários ligam inúmeras vezes ao dia, muitas vezes de maneira ríspida e intimidadora, e fazem ofertas indutivas sem grandes esclarecimentos para conseguir bater suas metas. O idoso nem sabe com que banco está falando tamanho o número de ligações que recebe”.
Sobre este tipo de assédio, o psicólogo e mestre em gerontologia, Carlos Lima, conta que sofreu algo parecido e que se sentiu intimidado com a situação: “Quando eu me aposentei recebia muitas ligações por dia deste tipo de empresa. Esse vazamento de dados é grave. Nunca solicitei empréstimos. Além disso, os familiares também precisam ter consciência porque muitas vezes o dinheiro não vai para o próprio idoso, mas para filhos, netos, familiares e quando o idoso vê está com apenas metade ou até menos de sua renda disponível para suas necessidades básicas como remédios, etc”.
Endividamento na pandemia
Segundo Ione Amorim, a situação acima descrita se agravou durante a pandemia. Para ela, medidas mais duras que regulamentem a ação das operadoras e financeiras são urgentes. “Temos 38 milhões de brasileiros pensionistas e aposentados, falando aqui só do INSS, e eles são alvos permanentes do assédio das instituições financeiras. Na pandemia, houve uma proposta para mudar a regra do consignado porque quando o Governo anunciou suporte financeiro à população, os bancos passaram a oferecer mais crédito extra aos idosos e aposentados quando o mais correto a se fazer era justamente suspender a cobrança por algum tempo e não dar mais dinheiro para aumentar ainda mais a dívida”.
Mudanças na legislação
Durante sua fala, a coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do IDEC, Ione Amorim, mencionou algumas ações no âmbito legal que tentam evitar que consumidores fiquem altamente envidados, em especial os idosos. Ela explica que a iniciativa se deu pelo aumento abusivo de empréstimos consignados e pelo crescimento de denúncias de assédio por parte das operadoras de crédito: “Já existe um PL em tramitação [PL 1805/2021 no Senado] que garantirá maior segurança ao consumidor em relação aos empréstimos, neste caso aqui estamos falando dos idosos. Embora não seja destinado apenas a esta faixa etária, este projeto beneficiará muito no combate a violência financeira contra os idosos. Primeiro porque ele foca na prevenção aos riscos na oferta de créditos e regulamenta a publicidade dessas facilidades, que aparecem com terminologias não muito claras e induzem o consumidor a decisões erradas. Depois porque trabalha também na educação financeira. O Brasil inteiro está repleto de idosos com sua renda totalmente comprometida por conta desse tipo de empréstimos”, explica.
Participação da sociedade civil
Ao final da reunião, munícipes puderam interagir enviando perguntas pelo chat da transmissão. A primeira a participar foi Semiramis Castro, que abordou a questão da solidão dos idosos como fator desencadeante de suicídios e questionou quais políticas públicas podem ser implementadas para melhorar o bem-estar dos idosos.
Respondendo a mensagem enviada pela munícipe, Maria Cecília de Souza Minayo, socióloga, antropóloga e doutora em Saúde Pública, sugeriu que familiares ofereçam oportunidades de interação ao idoso: “Temos que colocar o idoso na roda, no grupo. Qualquer ação que leve a relacionamento, comunidade, interação, ação. Há quem ache as rodas de encontro de idosos são besteira, mas elas também ajudam. Qualquer ação que aumente a valorização e a integração do idoso é válida. 34% das famílias brasileiras têm pelo menos um idoso em casa, então, mostrar a família como cuidar esse idoso também é importante”.
Na mesma linha, Ione Amorim falou da importância da ampliação dos espaços de convivência para idosos em todo o país: “Minha mãe tem 82 anos e pelo menos por 15 anos ela frequentou um núcleo promovido pela Secretaria Municipal de Cultura em que ela tinha aulas de artes, dança, artesanato e viagens e foi uma experiência muito rica pra ela. Esse tipo de espaço precisa ganhar mais relevância e estar presente em todos os municípios do país”, pontuou Amorim.
Marília Viana Berzins, doutora em Saúde Pública e presidente do OLHE também tratou do tema colocando os desafios de promover interação aos idosos em tempos de pandemia: “Estes núcleos de convivência precisam estar ainda mais presentes sobretudo nesta fase e promover rodadas de filmes, visitas, lives. Acham que o idoso não vai conseguir participar de uma live, mas estamos aqui, por exemplo. A gente até pode ter dificuldades, mas chegamos lá e acho que este é o grande desafio dos gestores públicos neste momento. Temos que aproximar essas pessoas e incluí-las virtualmente”, ponderou.
O psicólogo e mestre em gerontologia, Carlos Lima, trouxe a importância das faculdades abertas a terceira idade para o debate. Para ele, que atuou nestas instituições, os resultados deste tipo de projeto são impressionantes e merecem maior espaço: “Trabalhei por mais de dez anos como professor e coordenador nestes espaços e é incrível porque eles rompem paradigmas como o de que o idoso não gosta de novidades, não aprende mais, além de promover convivência e interação. É uma pena que estes cursos se esvaziaram um pouco nos últimos anos, mas deveriam ser recuperados”.
Cuidado com os golpes
Lucia Fátima também enviou sua pergunta aos especialistas pedindo sugestões de como evitar que idosos sejam vítimas de golpes e fraudes na internet.
Ione Amorim explicou que além das medidas legais já em tramitação, a ação de familiares e cuidadores é fundamental para evitar prejuízos: “Estamos lutando para mudar as regras junto às agências reguladoras, mas enquanto isso não sai do papel, idosos e familiares podem e devem denunciar nos canais que recebem esse tipo de demanda, bloquear o número do telefone para não receberem mais esse tipo de ligações e acompanhar o extrato dos consignados no site Meu INSS. Se observarem qualquer tipo de irregularidade, basta entrar em contato com o site consumidor.org.br e denunciar”, orientou a coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do IDEC.
Combate ao suicídio
Pedidos de sugestões de como agir em caso de idosos que manifestam intenção de cometer suicídio também foram enviados. Para estas manifestações, a professora Cecília recomendou: “Levem a sério, conversem, levem ao médico se necessário e acolham este idoso com carinho para entender o que tem causado tamanho sofrimento. Não é birra para chamar atenção. Há documentos no Google da OMS (Organização Mundial de Saúde) com dicas e sugestões que podem ajudar também neste sentido”, encerrou.
Canais para denunciar violência contra idosos
Em caso de violência física e maus-tratos, denunciar através do Disque 100 ou pelo WhatsApp no número (61) 9 9656-5008. Se a violência for patrimonial, como fraude ou abusos por parte das instituições financeiras, acesse: consumidor.gov.br
Clique aqui para assistir ao encontro na íntegra.