A Comissão de Educação (CE) aprovou nesta terça-feira (6) os nomes de Tiago Mafra dos Santos, Vinicius Clay Araujo Gomes e Alex Braga Muniz para a diretoria da Agência Nacional de Cinema (Ancine) após sabatina marcada por questionamentos sobre o suposto deficit nas contas do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) — fundo de desenvolvimento parcialmente gerido pela Ancine — em exercícios anteriores. As indicações seguem para análise do Plenário.
Indicado ao cargo de diretor-presidente da Ancine (MSF 8/2021), o procurador federal Alex Braga Muniz — que exerceu o cargo de diretor-presidente substituto da agência a partir de 2019 — admitiu “problemas sistêmicos” enfrentados pela Ancine, mas buscou afastar dúvidas sobre a garantia de verbas federais para o setor audiovisual: ele sublinhou que o FSA tem situação financeira equalizada para cumprir os compromissos assumidos.
— A Ancine fez esforços de austeridade para transferir recursos do próprio caixa para custear despesas operacionais do Fundo Setorial. Foram preservados recursos para novos investimentos. Hoje temos R$ 448 milhões à espera de investimento — resumiu.
A senadora Leila Barros (PSB-DF), apoiada por outros senadores, cobrou detalhes sobre a situação de “rombo” financeiro, resultante de editais de 2018, e “represamento” de recursos nos exercícios financeiros seguintes, que, segundo ela, deveriam ter sido aplicados para honrar compormissos assumidos anteriormente pela Ancine.
— Qual a interesse ou a vantagem de se manter o alto valor parado na conta? — indagou.
Muniz atribuiu os problemas ao processo cumulativo de anúncio de editais que eram lançados à conta de recursos orçamentários, impondo compromissos financeiros além dos disponíveis, o que levou a situação de “descompasso, desencontro de contas”.
— Não era feita uma análise de capacidade operacional para lançamento dos editais, quiçá de disponibilidade financeira. Se eu vou anunciar um edital que objetiva selecionar 100 projetos, dois requisitos mínimos devem existir: eu devo ter capacidade de analisar os 100 projetos e eu tenho que ter recursos para financiar os 100 projetos, sob pena de frustrar expectativas e prestar um desserviço a uma atividade tão relevante. E isso era praticado rotineiramente e reiteradamente na Ancine.
Após assumir interinamente a direção da agência no lugar de Christian de Castro Oliveira — afastado do cargo em 2019 em cumprimento à decisão judicial, acusado de repasse de informações sigilosas —, Muniz iniciou apuração para garantir o cumprimento dos compromissos assumidos e manter a continuidade da política pública. Ele acrescentou que a auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre os meios de aprovação de projetos da Ancine contribuiu para que “esse episódio não se repita”, e, sobre a redução nas seleções e contratações do fundo no último ano, sublinhou que o Ministério Público do Tribunal de Contas entendeu que os dirigentes da Ancine foram “prudentes” ao reduzir o ritmo dos novos projetos.
— Costuma-se dizer que a Ancine não lançou editais em 2020. A Ancine lançou linhas de crédito de capital de giro para empresas do setor audiovisual. Nos orgulhamos dessas linhas lançadas com o BNDES e que conseguiram, num curto espaço de tempo, colocar à disposição de todos os agentes da atividade, R$ 400 milhões — esclareceu.
Leila Barros também questionou Vinicius Clay Araujo Gomes sobre a falta de participação de representantes da Ancine quando convidados para audiências públicas na Câmara dos Deputados. O sabatinado esclareceu que a Ancine sempre prestou todas as informações necessárias ao Congresso, e mencionou duas reuniões da Comissão de Cultura que contavam com a participação de representantes do Ministério Público Federal e do Tribunal de Contas da União. As “formas alternativas de participação” da Ancine, segundo ele, foram propostas à comissão para evitar conflito e desinformação.
—No momento em que estavam em curso investigações e apurações em detrimento da pessoa dos diretores e da própria Ancine, a participação violaria o direito de defesa dos participantes e até a defesa institucional da Ancine, mas essas questões foram informadas à comissão.
Também indicado para o cargo de diretor (MSF 7/2021), Vinicius Clay Araujo Gomes defendeu a preservação da política setorial da Ancine — onde também atua desde 2006 como especialista em regulação da atividade cinematográfica e audiovisual —, lembrando que no Brasil, em 2018, o valor adicionado pelo setor audiovisual à economia brasileira foi de R$ 26,7 bilhões — maior que a de indústrias como a farmacêutica, a têxtil e a de componentes eletrônicos.
O indicado cobrou maior regionalização das produções brasileiras e espera a inauguração de mais salas de cinema, especialmente nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, nas cidades do interior e comunidades carentes, dentro do desafio de tornar o produto mais acessível.
— As salas de cinema ainda representam considerável fonte de receita para as produções audiovisuais, além de constituírem espaço relevante para a cultura, o entretenimento e a socialização.
Tiago Mafra dos Santos, indicado para o cargo de diretor (MSF 25/2021), respondeu a questionamento sobre a regulação do serviço de VOD (Video on demand), um setor de mercado que “vai passar, inclusive, a própria TV paga”, disse. Ele defendeu o papel da agência reguladora de “regular por informação”, mas, citando análise na Secretaria de Políticas Regulatórias da Ancine, entendeu que a imposição de cotas para conteúdo nacional é inadequada par um segmento que funciona por catálogo.
— Na verdade, o que isso vai fazer é a redução: você vai provocar a redução de catálogos e aumento na assinatura. Eu acho que uma preocupação anterior não é pensar essencialmente na garantia do conteúdo brasileiro nessas plataformas, mas o acesso, a ampliação do acesso a elas, lembrando que são tecnologias de fruição de audiovisual via internet.
O indicado já exerce na Ancine, desde 2006, o cargo de especialista em regulação da atividade cinematográfica e audiovisual. Nesse período, ele destacou sua atuação em estudos sobre mitigação de efeitos econômicos da pandemia sobre salas de exibição e sobre os efeitos regulatórios da fusão entre duas grandes operadoras de TV paga.
— A suspensão dos canais envolvidos na operação causaria mais danos ao mercado que qualquer suposto que poderia advir de sua vedação, limitando o acesso aos consumidores e reduzindo a oferta de conteúdo, inclusive o brasileiro — explicou.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)