Direitos do Cidadão
29 de Março de 2021 às 13h10
MPF: candidato cotista que teve matrícula indeferida deverá ser aceito em universidade
Caso ocorreu na Universidade Federal do Rio Grande (Furg), mas está tramitando na Justiça Federal no ES, local de residência do candidato
Imagem: Secom/MPF
Após parecer favorável do Ministério Público Federal (MPF), a Justiça Federal cancelou o ato administrativo que resultou na exclusão do estudante Rondinely Ferreira Silva Lima nas vagas reservadas para negros e determinou a efetivação de sua matrícula no curso de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande (Furg), onde ele foi selecionado por meio da chamada regular do Processo Seletivo Enem/Sisu.
A aprovação do candidato se deu por meio do sistema de cotas destinadas a candidatos pretos, pardos ou indígenas, com renda familiar bruta per capita de até um salário mínimo, que tenha cursado integralmente o Ensino Médio em escola pública. Além de apresentar o termo de autodeclaração étnico-racial, o candidato foi submetido à Comissão de Heteroidentificação da Pró-Reitoria de Graduação (Prograd), mas teve sua matrícula indeferida em virtude de não ter sido identificado o fenótipo preto ou pardo.
O candidato pediu nova avaliação e novamente teve seu pleito indeferido pela instituição, o que o levou a ingressar com uma ação judicial contra a Furg.
O juiz adotou os argumentos trazidos ao caso pelo parecer do MPF para decidir a sentença e citou que “o contexto sociorracial local pode se revelar decisivo para fins de determinação da pertença racial dos indivíduos. Isso porque a formação étnico-racial da população brasileira se deu conforme a história de cada região e/ou Estado, impactando de modo relevante na distribuição da diversidade fenotípica das pessoas pelo País. Sob essa perspectiva, um indivíduo considerado negro no extremo sul do Brasil – região em que a população negra é reduzida e não apresenta a mesma variabilidade fenotípica que em outros Estados da Federação – pode não o ser no contexto sociorracial nordestino, por exemplo”, destacou.
Nesse sentido, a sentença afirma que as comissões de verificação – em especial aqueles que não sejam representantes do poder público – sejam oriundos de movimentos sociais com notória representatividade local.
Parecer – O MPF defendeu em seu parecer que não havia indício de que o estudante estivesse agindo de má-fé. Inclusive, constam no processo ofício expedido pela Fundação João Pinheiro, vinculada à Secretaria de Planejamento e Gestão do Estado de Minas Gerais, e um atestado da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), ambos reconhecendo o enquadramento de Rondinely nos critérios fenotípicos de candidatos pretos, pardos ou indígenas nessas instituições.
“Ele já obteve o reconhecimento do seu enquadramento em vagas reservadas, por duas respeitáveis instituições públicas brasileiras, uma das quais, inclusive, federal, tal qual a Furg, de modo que a negativa dessa mesma condição em uma terceira instituição, para um curso extremamente concorrido, numa Unidade da Federação com população majoritariamente formada por brancos, pode constituir grave discriminação além, é claro, da flagrante violação da boa fé e da segurança jurídica”, defendeu a procuradora da República Elisandra de Oliveira Olímpio, autora do parecer.
O processo número 5003908-19.2020.4.02.5001 está tramitando na Justiça Federal no Espírito Santo por de tratar do local de residência do candidato.