Consumidor e Ordem Econômica
14 de Maio de 2021 às 13h35
MPF processa Inmetro por norma que expõe motociclistas a acidentes
Portaria editada a pedido de importadores possibilita comercialização de coroas de transmissão com baixo índice de qualidade
Foto: Pixabay
O Ministério Público Federal requer a imediata suspensão de uma norma do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) que permite importar e comercializar coroas de transmissão para reposição em motocicletas fora dos padrões seguros de qualidade. A portaria nº 358/2018 da autarquia prevê patamares mínimos muito baixos de dureza para esses produtos, o que abre espaço no mercado para peças com resistência bem inferior à daquelas fabricadas pelas próprias montadoras. Com isso, aumentam as chances de falhas e defeitos que podem causar graves acidentes envolvendo não só os motociclistas, mas também os demais motoristas e pedestres.
O MPF encaminhou o pedido de liminar à Justiça Federal por meio de uma ação civil pública ajuizada contra o Inmetro. Ao longo do inquérito civil que originou a ação, a autarquia admitiu que a portaria entrou em vigor a partir de solicitações de entidades do mercado, como a Associação Brasileira dos Importadores de Motopeças (Abimoto). Convocado a justificar tecnicamente a edição da norma, o Inmetro nunca apresentou estudos que demonstrassem a segurança dos parâmetros mínimos de qualidade definidos no documento.
A portaria nº 358/2018 derrubou outras duas de 2014 que estabeleciam índices mais rigorosos de dureza das coroas para reposição e buscavam impedir a comercialização de produtos de baixa resistência, oriundos principalmente da China. Segundo os critérios então fixados, poderiam ser importadas e vendidas somente peças de aço que passassem por tratamento térmico em sua fabricação, o que garante a durabilidade média de 35 mil a 40 mil quilômetros rodados, equivalente à das coroas originais.
Com as novas regras editadas em 2018, os índices exigidos caíram drasticamente. Em fevereiro daquele ano, o Inmetro abriu uma consulta pública para reduzi-los a patamares que poderiam assegurar vida útil às coroas por até 7 mil quilômetros, apenas. Em outubro, a autarquia publicou a portaria atualmente em vigor com parâmetros ainda mais frágeis. Na prática, peças comercializadas com base na norma não precisam suportar mais do que 2 mil quilômetros rodados.
“As coroas vendidas no mercado de reposição passaram a ser tratadas como se fossem materiais de baixíssima resistência, na forma de uma simples carroceria de automóvel ou uma carcaça de máquina de lavar roupa (feitas de aço ‘mole’, e que dispensam o tratamento térmico)”, escreveu a procuradora da República Karen Louise Jeanette Kahn, autora da ação do MPF. “Essa redução operada no grau de dureza das coroas tornou as motocicletas vulneráveis a acidentes, colocando em risco a saúde e segurança dos motociclistas”, acrescentou.
Estudos das Universidades de São Paulo (USP) e de Campinas (Unicamp) e do Instituto de Pesos e Medidas do Estado de São Paulo (Ipem-SP) já demonstraram que as alterações promovidas pela portaria nº 358/2018 viabilizam a redução da qualidade da coroa. Fabricada sem as técnicas e os materiais apropriados, a peça do sistema de transmissão fica sujeita a deformações, sobretudo na área dos dentes. Isso pode causar o rompimento da corrente ou até mesmo o travamento do motor, provocando o lançamento do motociclista para a frente.
Além da imediata suspensão da norma, o MPF pede que seja proibida a importação e a comercialização de peças liberadas para o mercado com base em índices reduzidos de qualidade. Ao final da tramitação do processo, o Ministério Público pleiteia que o Inmetro seja obrigado a editar uma nova portaria para restabelecer os padrões de dureza compatíveis com o grau de resistência que as coroas de transmissão devem ter.
O número da ação é 5010229-10.2021.4.03.6100. A tramitação pode ser consultada aqui.