Uma reflexão sobre os 80 anos da Justiça do Trabalho no Brasil é, antes de tudo, uma análise da construção das relações de trabalho no país ao longo de seus mais de cinco séculos de história. Compreender o surgimento, a consolidação e a crescente relevância que esta Justiça especializada ganhou (e continua ganhando) ao longo dos anos é compreender, também, as profundas questões sociais que permearam a história brasileira – um olhar para o passado para compreender o presente e vislumbrar possibilidades de futuro.
Sendo assim, faz-se necessário retornamos ao início de nossa fundação como sociedade: fomos uma nação que, entre meados do século XVI até fins do século XIX, foi construída sob a égide da escravidão. No contexto da expansão da economia mercantilista no início do século XVI, a economia do Brasil Colonial foi desenvolvida basicamente de modo que a colônia servisse à Metrópole, com a exploração de insumos e metais preciosos (pau Brasil, cana de açúcar, café e, posteriormente, ouro). A mão de obra escrava foi o pilar deste modelo: inicialmente, a escravidão indígena foi utilizada, porém apresentava contradições entre os interesses de missionários colonizadores cristãos, que objetivavam a catequização dos nativos, e os senhores de escravos, que desejavam maximizar a exploração do trabalho e os lucros. A opção pela utilização de mão de obra escrava africana explica-se, além disso, pela própria lógica de expansão mercantilista portuguesa: tendo colonizado a costa africana ainda no século XV, a utilização desse tipo de mão de obra fazia parte de uma lógica econômica que dava ainda mais força ao império colonial português.
A despeito das inúmeras discussões historiográficas que permeiam o estudo da escravidão no Brasil, fato é que este modelo de exploração de mão de obra, que desumaniza o trabalhador, criou profundas sequelas econômicas, humanas, culturais e sociais na formação brasileira, as quais são percebidas até hoje. Obviamente, a história da escravidão no país é marcada por exploração, segregação racial e social, mas também pelas resistências e revoltas . É importante ressaltar que o Brasil conviveu com este modelo social do século XVI até fins do XIX; sendo assim, é impossível refletir sobre aspectos fundamentais da sociedade brasileira sem levar em consideração que nossa sociedade foi erigida sob a égide da escravidão, o que se reflete até hoje – sobretudo quando tratamos do aspecto social e econômico.