A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o sócio pode se retirar imotivadamente de uma sociedade limitada – ainda que ela seja regida de forma supletiva pelas normas relativas à sociedade anônima –, nos termos do artigo 1.029 do Código Civil. Para o colegiado, a ausência de previsão da retirada imotivada na chamada Lei das Sociedades Anônimas – ou Lei das SAs (Lei 6.404/1976) – não implica sua proibição, uma vez que o Código Civil deve ser aplicado nas hipóteses de omissão daquele diploma legal.
O colegiado deu provimento ao recurso de um sócio que, na origem, ajuizou ação para anular a convocação de reunião em que seria discutida a sua expulsão. Segundo ele, não haveria interesse jurídico em tal deliberação, pois já havia exercido seu direito de retirada imotivada, tendo notificado extrajudicialmente os demais sócios.
O pedido foi julgado procedente em primeiro grau, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo concluiu que, embora a convocação fosse nula, por não indicar claramente a acusação contra o sócio, ele não poderia ter saído imotivadamente, uma vez que tal direito é inaplicável às sociedades limitadas que, expressamente, em seu contrato social, optaram por ser regidas de forma supletiva pela legislação das sociedades anônimas.
Simples notificação
O relator do recurso no STJ, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, explicou que a hipótese da retirada voluntária imotivada está prevista no artigo 1.029 do Código Civil, segundo o qual o sócio pode se retirar da sociedade de prazo indeterminado mediante simples notificação aos demais sócios.
“Esse dispositivo, conquanto inserido no capítulo relativo às sociedades simples, é perfeitamente aplicável às sociedades de natureza limitada, conforme a jurisprudência deste Superior Tribunal, de modo que o sócio, também nesse tipo societário, tem o direito de se retirar de forma imotivada, sem que seja necessária, para tanto, a ação de dissolução parcial”, afirmou.
O magistrado verificou que a sociedade limitada em questão apresenta a peculiaridade de ser regida supletivamente pelas normas aplicáveis às sociedades anônimas, como expressamente previsto no contrato social.
Sanseverino ressaltou que o artigo 1.053 do Código Civil, ao mesmo tempo em que estabelece que a sociedade limitada deve se reger subsidiariamente pelas normas da sociedade simples, autoriza de forma expressa, em seu parágrafo único, que o contrato social preveja a regência supletiva pelas normas da sociedade anônima.
Direito fundamental
Segundo o ministro, na hipótese de eventual omissão no capítulo do Código Civil que trata das sociedades limitadas, a complementação deve se dar, a depender do contrato social, ou pelas normas das sociedades simples ou pela lei especial reguladora das sociedades anônimas.
Para Sanseverino, a aplicação supletiva da Lei 6.404/1976 não tem o efeito de afastar o direito de retirada imotivada nas sociedades limitadas de prazo indeterminado, uma vez que a própria Constituição Federal expressamente garante, em seu artigo 5º, XX, tanto o direito fundamental de associação quanto o de não associação.
Além disso, o relator lembrou que a aplicação supletiva da lei das sociedades anônimas, autorizada pelo parágrafo único do artigo 1.053 do Código Civil, apenas deve ocorrer naquilo que for compatível com o regramento das sociedades limitadas.
“Nesse sentido, a simples ausência de previsão de retirada voluntária imotivada na Lei 6.404/1976 não pode ser automaticamente interpretada como proibição de sua ocorrência nas sociedades limitadas regidas supletivamente por essa norma”, afirmou Sanseverino.
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